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terça-feira, 6 de dezembro de 2016

Um golpe contra a Educação e o Magistério

Por Gabriel Magno, Iolanda Rocha, Ruth Brochado, Hamilton 
Caiana, Henrique Torres e Alessandra Terribili*

A esta altura do campeonato, boa parte da população brasileira já entendeu o que estava em jogo quando partidos de direita, sindicatos patronais e os setores mais conservadores da sociedade se articularam para aplicar o golpe de Estado que está em curso. Reforma da Previdência, congelamento do investimento público por 20 anos, Ensino Médio sob ameaça e muita repressão. É nesse contexto que ganham força as teses conservadoras e autoritárias da ONG “Escola Sem Partido”.

Antes de mais nada, é preciso destacar que os projetos de lei que levam esse nome não se referem à presença ou não de partido na escola. Como todo agrupamento que se autodeclara “apartidário”, esse também visa a manipular o senso comum de forma hipócrita e oportunista para fazer prevalecer a sua própria ideologia.

A real intenção do Projeto de Lei da Mordaça é eliminar das salas de aula o contraditório, a diversidade, o pensamento crítico. Para quem ainda tem dúvida, basta saber que por trás desses PLs está o Instituto Millenium, conhecido espaço de elaboração da direita brasileira, que reúne figuras alimentadas pelo ódio de classe e intolerância, como Rodrigo Constantino e Diogo Mainardi. Tal coletivo conta com a participação entusiasmada de PSDB e DEM. Fica óbvio, portanto, que a “Escola Sem Partido”, de sem partido, não tem nada.

As iniciativas desastradas e autoritárias

Foi Izalci Lucas (PSDB-DF) quem tomou as premissas da ONG comandada por Miguel Nagib para apresentá-las em formato de projeto de lei à Câmara Federal (PL 867/2015). Nenhuma surpresa, afinal, as propostas do PSDB para a Educação ficaram claras nos oito anos de Governo FHC e nos estados de São Paulo, Paraná e Goiás, suas principais vitrines, caracterizados pelo sucateamento da escola pública e pela truculência e desvalorização com que se tratam os professores e estudantes.

Ainda que a Lei da Mordaça não tenha sido aprovada, alguns parlamentares já se utilizam dela para promover a perseguição de professores (as) e a censura, recuperando esses fundamentais elementos da ditadura militar. O projeto proíbe professores (as) de convidar seus estudantes para manifestações, atos públicos e passeatas. Um ataque deliberado à liberdade de manifestação e de organização, que remete outra vez e com mais ênfase ao período ditatorial.

Na Câmara Legislativa do Distrito Federal, Sandra Faraj (SD) e Rodrigo Delmasso (PTN) lideram um conjunto de deputados (as) que têm se esmerado em formular propostas absurdas para a Educação, sempre com forte viés autoritário e desprezo por professores (as) e orientadores (as). Na mesa do governador Rollemberg, por exemplo, está o PL 137/2015, aguardando sanção ou veto. O projeto busca levar os “valores de família” às salas de aula como temática transversal. Por trás de cada iniciativa desastrada como essa está a intenção de impor um conceito de família pertinente a uma crença específica; que reprime e marginaliza aqueles e aquelas que não se enquadram nos seus conceitos particulares. É uma violência contra a democracia, a laicidade do Estado e a liberdade de pensamento e de crença.

Sandra Faraj também tem enviado ofícios a escolas para cobrar explicações e “providências” contra professores e professoras que trabalham com seus/suas estudantes questões relativas aos direitos humanos, argumentando que as questões de gênero e de orientação sexual foram retiradas do PDE (Plano Distrital de Educação). Infelizmente, a deputada e sua assessoria parecem desconhecer a Lei de Diretrizes e Bases (Lei 9394/1996), que estabelece em seu artigo 3º “o respeito à liberdade e apreço à tolerância” como princípios básicos do ensino. Esquece também que a Lei Orgânica do DF estabelece em seu artigo 2º que “ninguém será discriminado ou prejudicado em razão de convicções políticas ou filosóficas e orientação sexual”, e que o artigo 3º determina que um dos objetivos prioritários do Distrito Federal é “garantir e promover os direitos humanos assegurados na Constituição Federal e na Declaração Universal dos Direitos Humanos”. A mesma Lei Orgânica destaca em seu artigo 235 que “a rede oficial de ensino incluirá em seu currículo, em todos os níveis, dentre outros conteúdos programáticos, a educação sexual”, e no 237, que “é dever do Poder Público estabelecer políticas de prevenção e combate à violência e à discriminação, particularmente contra a mulher, o negro e as minorias”. Além de ignorar a Constituição Federal, que assegura a liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber; o pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas; a valorização dos profissionais da educação escolar e a gestão democrática do ensino público (artigo 206).

O PELO (Projeto de Emenda à Lei Orgânica) nº 38, assinado pelo deputado Rodrigo Delmasso, quer incorporar à Lei Orgânica do DF a “garantia do direito dos pais a que seus filhos recebam educação moral de acordo com suas próprias convicções”. Não é apenas autoritário, mas também profundamente obtuso: numa sala de aula que, via de regra, representa a pluralidade presente na nossa sociedade, como obedecer à orientação moral de um desconsiderando a do outro e abstraindo a sua própria?

Causa-nos profunda indignação que esses (as) parlamentares desconheçam os reais problemas das escolas públicas do DF hoje; ou que não estejam preocupados (as) em solucionar a situação dramática da saúde pública, do transporte coletivo ineficiente e caro, e das profundas desigualdades sociais no Distrito Federal. Resta-lhes, portanto, muito tempo para executar patrulha moral sobre o trabalho sério que professores e professoras desenvolvem nas nossas escolas, visando a construir tolerância, respeito e igualdade.

Questões de gênero, orientação sexual e combate ao racismo

Ao inventar a expressão “ideologia de gênero”, os porta-vozes da direita conservadora e intolerante buscam massacrar a diversidade. Assim, pretendem manter a comunidade LGBT invisibilizada e marginalizada; e contribuem para a reprodução das tantas violências cometidas contra mulheres e população negra cotidianamente. As consequências disso estão diariamente nos noticiários: pessoas homossexuais assassinadas em crimes de ódio; mulheres estupradas, violentadas, mortas em crimes de misoginia; negros e negras sofrendo todo tipo de violência, perseguição, exclusão e preconceito. Claro, pois segundo os idealizadores do Projeto de Lei da Mordaça, a escola não é lugar de combater a cultura do ódio, da discriminação e da opressão.

De acordo com Bráulio Porto de Matos, um dos principais defensores da Lei da Mordaça, em debate na Comissão de Educação da Câmara dos Deputados no último dia 31 de maio, o ensino de história e cultura da África nas escolas deveria ser extinto. Para ele, tal conteúdo expressa uma ideologia: “Então, deveríamos estudar a história da Itália, da Alemanha, do Japão”, disse. E foram exatamente esses três os países citados.

A incomensurável tolice de tal aferição reside no fato de que nossas escolas, ao falar das origens do povo brasileiro, sempre abordaram a história e cultura europeias quase que exclusivamente. Da mesma forma, os seguidores do PL da Mordaça pretendem eliminar, ou, no mínimo, reduzir substancialmente a importância da história política e socioeconômica da América Latina. Para os defensores e defensoras da Mordaça, nossos alunos devem ser limitados a conhecer a história e a cultura dos povos europeus e estadunidenses, filtrando o conhecimento ao qual eles podem ou não ter acesso. Nada mais ideológico que isso.

Não vai ter golpe contra a Educação

A ideologia da Escola Sem Partido é óbvia: a manutenção e o recrudescimento do padrão de opressões que nosso país conhece há mais de 500 anos, com seus atentados à soberania nacional e subordinação a interesses das tradicionais potências estrangeiras.

Esses aspectos marcam também o golpe em curso: ele é contra os(as) trabalhadores(as), como vimos anunciando há meses. O golpe é pela reversão dos avanços conquistados desde a Constituição de 88 e aprofundados nos últimos 12 anos, e pelo restabelecimento da lógica da mercantilização de direitos e da organização do Estado neoliberal com elementos fascistas, patriarcais e racistas.

Por isso é imprescindível impor uma derrota acachapante ao Projeto de Lei da Mordaça. Em defesa da democracia, dos direitos sociais, e da soberania do povo brasileiro. Afinal, os Projetos de Lei oriundos da ONG “Escola Sem Partido” têm mesmo a cara do segmento que os concebeu: além de colonialista, subserviente, escravocrata e intolerante; é ignorante.

* Gabriel Magno, Iolanda Rocha, Ruth Brochado e Hamilton Caiana são diretores do Sinpro-DF; Henrique Torres é dirigente da CUT-DF; Alessandra Terribili é jornalista e assessora política do Sinpro-DF.

sexta-feira, 28 de outubro de 2016

A violência do golpe

Um ano atrás, professores e professoras em greve no Distrito Federal foram covardemente atacados pela Tropa de Choque a mando do Governador Rollemberg e seus cúmplices. A manifestação paralisou o Eixão na saída norte e na saída sul por cerca de meia hora, e nós já estávamos nos dirigindo aos nossos carros para sair de lá quando a polícia chegou e promoveu aquele festival de agressões, arbitrariedades e pancadaria que nunca vamos esquecer.

Era só o começo de um triste período marcado por violência, violação de direitos e retrocessos até no plano cívico. Um ano depois, a lei do Plano de Carreira do magistério segue sem ser cumprida - o governador anunciou que, mais uma vez, descumprindo o acordo de fim de greve, ele não vai pagar a última parcela do referido Plano.

A greve é um instrumento legítimo da classe trabalhadora. Ninguém faz greve por esporte, é o último recurso para quem só tem a paralisação da própria força de trabalho como mecanismo para garantir a efetivação de seus direitos. É difícil construir uma greve, é difícil manter uma greve. Mas é preciso fazer greve. Os responsáveis por existirem greves não são os trabalhadores, são seus patrões.

O Plano de Carreira dos professores e professoras do DF é motivo de orgulho da categoria, e foi conquistado com muita luta, depois de uma greve de 52 dias em 2012. O que Rollemberg faz agora é desrespeitar a lei. Entretanto, quem é punido pela Justiça são aqueles que lutam para fazer valer a lei.

Infelizmente, a cada dia que passa, mais elementos nos indicam que o golpe que tanto denunciamos nos trouxe a um Estado de exceção, no qual governo golpista, Congresso Nacional e Poder Judiciário estão articulados e empenhados em esmagar os trabalhadores (as), suas organizações e ações políticas.

O STF anulou o direito de greve garantido pela Constituição de 1988. Há, a todo momento, ameaças de ações truculentas contra a ocupação de escolas por estudantes secundaristas, que nos dão uma aula em defesa da Educação ao levantar-se contra a MP do Ensino Médio, autoritariamente lançada pelo governo golpista para sucatear o ensino público.

Um ano atrás, aquelas imagens chocaram o país inteiro: professores e professoras sendo covardemente violentados em Brasília pela Polícia Militar. Alguns foram presos, alguns sangraram, outros entraram em estado de choque. As marcas ficaram em todos nós que estávamos lá, e também, em milhares que não estavam. E por mais que já suspeitássemos, ainda não sabíamos, então, que a violência do golpe se recrudesceria a cada dia.

Cassaram nossos votos ao cassar a presidenta que elegemos. Constituíram um governo golpista com os nomes e programa daqueles que tinham sido derrotados nas urnas. Sob o pretexto de combater a corrupção, inauguraram um Estado de exceção no qual a esquerda é suspeita de tudo, exatamente como foi em 1964. Depois, construíram fortes para proteger os corruptos, seus mandatos e suas propriedades. Vão estrangular a educação e a saúde pública por vinte anos, entregar o pré-sal para as potências imperialistas, e nos proíbem de reagir.

Se isso não é ditadura, não sei que nome tem.

terça-feira, 11 de outubro de 2016

Fraudes, mentiras e falácias: fundamentos da Lei da Mordaça

Ruth Brochado e Alessandra Terribili*

Que os PLs autodenominados “Escola Sem Partido” baseiam suas premissas em falácias, todos já sabemos. A principal delas reside no próprio nome, afinal, o projeto não se refere à disputa partidária no interior das escolas. O que ele pretende, de fato, é assegurar o predomínio de suas próprias convicções conservadoras, forjando um pensamento único caracterizado pela intolerância e pela ignorância.

No DF, os porta-vozes das trevas adotaram a tática de fatiamento do projeto, ou seja: fragmentaram-no e apresentaram-no em partes, inclusive apelando a fundamentos inconstitucionais. Seus idealizadores propõem a perseguição de professores (as) e a censura de conteúdos sob o pretexto de defender o “direito dos pais a que seus filhos menores recebam a educação moral que esteja de acordo com suas próprias convicções”. Ora, e como cumprir tal promessa em meio a uma diversidade de convicções, expectativas, referências morais e visões de mundo que há numa sala de aula? E mais: é desejável que, num espaço público, os diferentes não entrem em contato?

Portanto, a Lei da Mordaça não é apenas uma falácia, é também hipócrita e autoritária. Ao anunciar sua cruzada contra uma suposta “doutrinação” praticada por professores e professoras, os defensores (as) da Mordaça pretendem, na realidade, manter sua doutrinação particular. Para isso, precisam expulsar o senso crítico das escolas, como quis fazer a ditadura militar de diversas formas – inclusive, prendendo, exilando, torturando e matando professores (as).

Gênero

Para argumentar suas frágeis teses, os autores dos Projetos de Lei da Mordaça apelam a conceitos vazios, como a tal “ideologia de gênero”.

Na literatura feminista, o conceito de gênero aparece pela primeira vez em 1975, na definição de Gayle Rubin. Basicamente, trata-se de afirmar que a desigualdade entre homens e mulheres, geradora de toda sorte de violência, conflitos e exclusão, não é natural, mas sim, construída socialmente. Isso quer dizer que a opressão das mulheres é sustentada há séculos por valores morais e práticas sociais e econômicas que condenam a mulher à submissão. De acordo com os idealizadores da Lei da Mordaça, são esses os valores morais que devem circular livremente nas escolas, sem questionamento ou confronto de ideias.

Não há teórica ou liderança feminista que utilize o termo “ideologia de gênero” para se referir a qualquer coisa. “Gênero” não é uma “ideologia”, mas sim, um conceito, uma categoria de análise. Portanto, podemos afirmar que aquela é uma expressão fabricada por eles para causar pânico nas suas bases e, assim, gerar a comoção necessária para implementar seu projeto reacionário e autoritário para a Educação.

Na Câmara Legislativa do DF, há PLs em tramitação como o 1138/2016, de autoria de Sandra Faraj (SDD), que não só proíbe a “aplicação da ideologia de gênero” como visa a impedir que qualquer proposição que relacione o termo gênero à construção de políticas pedagógicas seja sequer discutida pela Câmara. Na justificativa do projeto, encontramos um festival de estupidezes de todos os formatos. Referenciando-se em nota política emitida por uma pequena associação de pediatras conservadores estadunidenses, a parlamentar diz que “ideologia de gênero” é uma “corrente” que contraria “até a teoria da evolução, a biologia e tudo mais que já se ouviu falar” (sic). Ironicamente, Faraj afirma que conceitos como identidade de gênero e orientação sexual foram suprimidos dos textos do PNE e do PDE por “falta de base científica”.

Assim sendo, os (as) parlamentares que se utilizam da expressão “ideologia de gênero” em seus projetos deveriam ser convocados a revelar as devidas referências teóricas e políticas associadas ao termo. Não podemos aceitar que a Câmara Legislativa, que deveria reunir representantes do povo para estudar, discutir e propor de forma séria e consequente, se dê o luxo de basear seus debates em expressões fraudulentas sem nenhuma fundamentação teórica ou política.

Educar para a igualdade

Enquanto isso, no mundo real, as mulheres continuam sofrendo todos os tipos de violência sexista, sendo as negras as mais vulneráveis. Os dados atestam:

3 em cada 5 mulheres jovens já sofreram violência em relacionamentos. (Instituto Avon/Data Popular – 2014)

56% dos homens admitem já ter praticado algum tipo de violência. (Instituto Avon/Data Popular – 2013)

Em 2015, um relato a cada 7 minutos. 85.85% dos casos estão no ambiente doméstico; quase 70% dos agressores são parceiros ou ex-parceiros. Mais da metade dos assassinatos de mulheres se dão em contexto de violência doméstica. Maioria das vítimas são negras. (Levantamento do Ligue 180)

De acordo com a publicação Estatísticas de Gênero – Uma análise dos resultados do Censo Demográfico 2010, do IBGE, pode-se inferir que as mulheres ainda são maioria entre os desempregados, entre os trabalhadores informais ou precarizados. Quanto aos rendimentos, as mulheres recebem, em média, 67,7% do rendimento dos homens que realizam mesma função. Essa realidade é mais cruel com as mulheres negras e as rurais.

Menos de 10% da Câmara dos Deputados são mulheres, o que prejudica decisivamente a capacidade do Poder Legislativo de produzir e aprovar políticas de combate a essa triste realidade.

O conceito de gênero nos ensina que nenhum desses dados é natural ou inevitável, mas sim, que podemos formar seres humanos capazes de romper com as desigualdades e construir um mundo melhor para todos e todas. O que não é natural pode ser mudado. A Educação precisa estar a serviço do combate à cultura do estupro, da discriminação e às diversas formas de violência e de opressão, contribuindo para formar cidadãos e cidadãs a partir de valores como respeito, igualdade e solidariedade.

Conforme fica nítido no discurso dos defensores e defensoras da Lei da Mordaça, a real intenção dessa iniciativa é manter as relações de poder tal qual estão: opressão das mulheres, exclusão dos negros e negras, invisibilização da população LGBT. Todas as pessoas que desejam construir um mundo melhor precisam se opor firmemente à Lei da Mordaça.

* Ruth Brochado, professora e militante feminista, é diretora da Secretaria de Mulheres do Sinpro-DF; Alessandra Terribili, mestra em ciência política e militante feminista, é assessora política do Sinpro-DF.

quinta-feira, 21 de julho de 2016

Escola Sem Partido: por uma Educação medíocre e enganadora

A Lei da Mordaça, estupidez galopante formulada por um advogado das causas obscurantistas e conservadoras, não tem como alvo os partidos, nem mesmo o suposto problema do proselitismo partidário. Até porque ele mesmo tem partido e quer ver sua ideologia organizando a escola e a Educação.

A iniciativa pretende exterminar a construção de senso crítico e massacrar a diversidade presente nas nossas escolas, que somente é uma amostra da diversidade do mundo fora delas. E assim sendo, não é "só" a democracia que será atacada pelo projeto: a qualidade do ensino, de forma geral, estará.

Há 17 anos, um artigo de Rubem Alves num jornal de grande circulação me chamou a atenção para sempre. Nele, o educador trazia uma importante reflexão, ao contar a história da aeromoça a quem perguntou qual o rio que se avistava ao sobrevoar o Paraná. Ela, sorridente, respondeu que era o São Francisco.

"Posso jurar que ela não colou para passar de ano. Ela sabia direitinho os nomes. Sabia também olhar os mapas. Nas provas, marcou certo o rio São Francisco. Na escola, tirou dez. Então, como explicar que ela visse o São Francisco no norte do Paraná? A resposta é simples: não foi ensinado a ela que o mapa, coisa que se faz com símbolos para representar o espaço, só tem sentido se estiver ligado a um espaço que não é símbolo, feito de montanhas, rios de verdade, planícies e mares. Saber um mapa é ver, pelos símbolos, o espaço que ele representa".

O que Miguel Nagib e seus seguidores querem é ferir de morte exatamente isso. Querem que a escola se limite a falar das fases da mitose, do seno e do cosseno, da vegetação do sul da Ásia, das causas da Guerra dos Cem Anos; fazendo disso tudo apenas símbolos que não saem do laboratório, conhecimento sem sentido.

Expulsar o pensamento crítico das escolas é fortalecer esse olhar medíocre sobre a Educação; é contribuir para formar jovens incapazes de estabelecer relações e de se instrumentalizar dos símbolos para ler o mundo real. Como bem apontava Rubem Alves, conhecimento que não decifra a vida e não ilumina o mundo não é conhecimento. É enganação. Uma ótima palavra, aliás, para definir a tal Escola Sem Partido.

(Alessandra Terribili)
***

PS: É sintomático que, 17 anos depois, eu recorra ao mesmo artigo para falar de Educação que eu usava na época, quando estávamos no auge do combate contra o Provão. Os tempos sombrios estão mesmo de volta.

PS 2: O artigo do Rubem Alves está no link http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz11079909.htm.

sexta-feira, 13 de maio de 2016

A volta dos que não foram

É mesmo a volta dos que não foram. Para quem tinha qualquer dúvida, o anúncio do "novo" ministério salda todas. Sem obter nenhum voto, Michel Temer assume "interinamente" e traz para o Governo Federal aqueles que foram derrotados nas últimas eleições, para implantar a sua "Ponte para o Futuro" (sic) que representa pura e simplesmente o programa derrotado nas últimas eleições.

Para mim, que comecei minha militância no movimento estudantil e, duas décadas depois, trabalho com um sindicato de professores, é simbólico e melancólico ver essa figura da foto de volta à cena.

Ao lado do ministro da educação (minúsculo mesmo) recém-empossado, está Maria Helena Guimarães Castro, que presidiu o Inep durante o governo FHC e era mulher de confiança do então ministro Paulo Renato de Souza. Ela foi responsável pela implementação do provão, que eu e tantos combatemos com afinco, denunciando a privatização escondida nas entrelinhas daquele fajuto instrumento. Foi das grandes elaboradoras do projeto mercantilização da Educação que tentaram nos enfiar goela abaixo, especialmente nas universidades, mas nós resistimos, nós o derrotamos e até tripudiamos sobre ele... Até agora há pouco: essa senhora será secretária-executiva do "novo" MEC, que recuperará o sentido que tinha na ditadura militar.



Maria Helena também foi Secretária de Educação em São Paulo, onde nasci - e onde o PSDB vai completar 24 anos de governo: há toda uma geração que nunca viu outro partido governar São Paulo -, e reagiu com toda truculência característica do seu partido a uma das maiores greves de professores da história do estado. Maria Helena, que quis implementar um programa de remuneração por mérito para os profissionais da Educação. Lá, onde a Educação Pública vai de mal a pior, sendo desmontada dia a dia, com professores desmotivados e desvalorizados, e onde estudantes são criminalizados por tentar defender sua escola desses ataques. Lá, onde a verba da merenda é desviada sem nenhuma investigação; aliás, lá, onde toda e qualquer tentativa de investigar alguma coisa é enterrada de véspera. 

Parabéns aos envolvidos por trazerem de volta essa galera das catacumbas.

Quanto a nós... Estaremos onde sempre estivemos. Resistir e enfrentar vocês é algo que fazemos muito bem. Especialmente na Educação.

quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Greve vitoriosa

Aqui não há uma análise política. Há palavras humanas sobre uma ação humana.
***

Sempre vou me lembrar do Antônio Cândido dizendo: toda greve é vitoriosa, pela mobilização e pela reflexão que possibilita. Eu era estudante da USP e aquela foi minha primeira greve.

Quinze anos e algumas greves depois, eu continuo aprendendo o sentido daquela frase. Foram vinte e nove dias intensos, preenchidos por discussões acaloradas nas escolas, no comando de greve, nos corredores, pelo telefone (especialmente pelo tal do whatsapp). Preenchidos por sangue, suor e lágrimas, literalmente. Preenchidos por muita paixão, confiança, fé nos ideais, solidariedade, medo, coragem, tudo se alternando ao mesmo tempo agora. As frustrações que vinham de conversas com colegas fura-greve. A vontade de vencer que essas mesmas conversas despertavam, porque se tudo fosse fácil, ninguém precisava lutar. É por isso que lutadores e lutadoras são imprescindíveis: não é fácil, mas alguém tem que fazer. Se não, o mundo não muda.

Guardarei muitas imagens desta greve na minha mente para sempre. A violência policial contra nós no Eixão Sul, quando já nos preparávamos para deixar o local – aquela covardia que marcou a mim menos do que a companheiros(as) que foram presos(as) e agredidos(as), e certamente marcou a história do Distrito Federal. A assembleia que sucedeu esse episódio, com quase 15 mil professores e professoras na Praça do Buriti. Um líder da oposição entrando na escola empunhando a bandeira do Sinpro. A bandeira vermelha do Sinpro tremulando desde dentro da sala da Presidência da Câmara. O baralho feito em cartões de visita para suportar as horas de ocupação. O carro de som em Santa Maria, dirigido por um motorista que não conhecia a cidade e, pensando estar na contramão, disparou na rua, deixando os(as) manifestantes para trás. As professoras grevistas que, ao visitar um Jardim da Infância para convencer o grupo de professores(as) a entrarem em greve, assumiram uma turma de pequenos para que seu professor pudesse ir para a sala de coordenação nos ouvir. A música do faraó simbolizando os desmandos do GDF e da Justiça, mas animando a tarde dos guerreiros e guerreiras que fizeram greve de fome.

Tenho orgulho de ter participado dessa história. Vitórias foram construídas, outras ficaram por construir. E eu não tenho dúvida que o grau de mobilização e de reflexão proporcionado por esta greve não só fazem jus às sábias palavras de Antônio Cândido, como abrem caminho para completá-las: o carinho e os abraços que há entre as pessoas enlaça a luta perfeitamente bem, e faz com que se desfaça no ar a dureza das pedras que nos atiram. É bom demais trabalhar com essa categoria!

Rollemberg que se cuide. Já estamos prontos e prontas para a próxima.


terça-feira, 16 de junho de 2015

O Plano Distrital de Educação e o obscurantismo autoritário e desqualificado na CLDF

Hoje tivemos mais um triste episódio que demonstra a total desqualificação dos setores conservadores e da direita nos parlamentos deste país. A exibição de luxo dessa boçalidade se deu em meio a uma importante vitória do Sinpro-DF e demais entidades e movimentos integrantes do Fórum Distrital de Educação: a aprovação do PDE (Plano Distrital de Educação).

Ainda pela manhã, em reunião da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), já se percebiam cartazes e intervenções contra a "ideologia de gênero".

[Colchetes: eu não sei que diacho é isso. Nunca vi nenhuma militante, teórica, estudiosa, pesquisadora, dirigente feminista ou do movimento LGBT se referir a uma "ideologia de gênero". Aliás, eu sempre fui a primeira a chamar a atenção de minhas próprias companheiras feministas quanto a esse conceito: gente, gênero não é sujeito político. Não existem plenária de gênero, política de gênero, violência de gênero. Existem plenária de mulheres, políticas para as mulheres, violência contra as mulheres. Não podemos nós esconder as sujeitas dessas situações todas. Gênero é recorte, é categoria de análise, é um conceito útil para compreender a construção social do feminino e do masculino.]

Mas esse pessoal das trevas inventou a tal coisa que é a ideologia de gênero. Enfim.

E então, líderes de igrejas cristãs (não sei quais, não entendo disso) no parlamento passaram a criticar o PDE afirmando que este fazia apologia à tal da "ideologia de gênero". Os cartazes das pessoas traziam dizeres em defesa da família tradicional e outras bobagens que elas se recusam a entender que faz parte da crença religiosa delas, e elas não podem impor a crença religiosa delas a todo mundo, que isso é feio.

Se você perguntasse para essas pessoas onde no projeto está a defesa da tal da "ideologia de gênero", a pessoa:

a) Fazia cara de paisagem;
b) Juntava meia-dúzia de palavras sem lé com cré e, no fim, não respondia;
c) Gritava, te xingava ferzomente, se retorcia.

Era óbvio que aqueles cidadãos e cidadãs não conheciam o texto ora sob apreciação. Mas, para mim, que ainda não perdi totalmente a fé na humanidade, já não era tão óbvio que seus representantes no legislativo também desconhecessem o projeto que eles mesmos estavam colocando em votação.

Em suas intervenções, deputados como Rodrigo Delmasso (PTN), Raimundo Ribeiro (PSDB) e Sandra Faraj (Solidariedade) diziam que a "ideologia de gênero" presente no PDE (???!!!!) destruiria a família; que as crianças não mais seriam educadas como meninos ou meninas, mas que decidiriam isso ao atingir a maioridade; atrocidades desse nível. Ou seja, ou esses parlamentares são mais que medíocres e limitados, e sim, bastante ignorantes mesmo; ou então, são mal intencionados, o que coloca em questão seu próprio caráter. Em qualquer das alternativas, eles não merecem os mandatos que lhes foram oferecidos.

O pobre Plano só pretendia - como vocês, pessoas capazes de juntar lé com cré, facilmente supõem - que todos os seres humanos dentro de uma escola sejam tratados com igualdade. Que se desconstruam preconceitos, discriminações e qualquer forma de opressão de alguém sobre outro alguém. Porque isso também é feio.

Mas o pessoal das trevas não admite isso. Parece que querem manter a população LGBT excluída, marginalizada, vulnerável. Não se importam com os milhares e milhares que morrem em decorrência da homofobia assassina que eles alimentam e valorizam. São cúmplices dessas mortes, e depois rezam impunemente para seu deus.

Afora as questões referentes a orientação sexual, diversidade e RECORTES de gênero; os deputados da CLDF não quiseram nem saber do Plano Distrital de Educação. Não debateram suas metas e estratégias; a oferta de vagas; a educação de jovens e adultos; a valorização dos profissionais da educação; o financiamento da educação. Mas, isso sim, retiraram toda e qualquer flexão de gênero do texto - aparentemente, há quem se incomode muito com o saudável hábito de visibilizar as mulheres nos textos políticos.

É uma gente pequena, tão pequena, mas tão pequena, que eu só posso lamentar. E festejar que, apesar de todo o obscurantismo que impediu que o texto contemplasse a diversidade presente nas nossas escolas e na nossa sociedade, nem a boçalidade desse pessoal das trevas pôde impedir que o DF tenha, agora, um plano com metas e estratégias a serem alcançadas para a Educação num prazo de dez anos.

Que venha a próxima década. A disputa pela igualdade não acabou esta tarde.

segunda-feira, 15 de junho de 2015

Não à truculência, ao autoritarismo e à mordaça!

Na noite de 25 de maio, em Audiência Pública na Câmara Legislativa, dirigentes do Sindicato dos Professores no DF (Sinpro-DF) foram expulsos das galerias com agressividade, o que provocou o repúdio e a retirada em bloco de todos os professores e professoras que compareceram ao evento, inclusive do dirigente sindical que compunha a mesa.

A presidenta da sessão era a deputada Sandra Faraj (Partido Solidariedade), autora do projeto então em pauta. Na ocasião, a deputada levara uma claque para aplaudi-la e saudar o projeto, ainda que boa parte daquelas pessoas tenha demonstrado total desconhecimento quanto ao conteúdo. A mesa era composta por defensores das ideias ali contempladas, com a exceção única do dirigente do Sinpro-DF, que, afinal, teve de se retirar como forma de protesto contra a agressão sofrida por seus colegas.

Partiu de Sandra Faraj a ordem para que os seguranças retirassem à força os professores do local. Para isso, ela utilizou o mesmo microfone com o qual presidiu a sessão. A atitude autoritária e truculenta da deputada representa com muita coerência o projeto que ela defende. É importante saber do que trata o PL 01/2015 para conhecer a grave ameaça à qual as escolas do Distrito Federal e do Brasil estão sujeitas, e para entender por que é fundamental mobilizar-se para defender uma educação laica, democrática e de qualidade para formar cidadãos e cidadãs.

“Escola Sem Partido”

Em primeiro lugar, é preciso revelar que o PL 01/2015 que tramita na Câmara Legislativa do DF não é exatamente de autoria de Sandra Faraj. O mesmo conteúdo tem sido apresentado em diversas Assembleias Legislativas e Câmaras Municipais, e são todos derivados do PL 867/2015, apresentado à Câmara Federal pelo deputado Izalci (PSDB/DF). Mas também não é ele o autor original da ideia.

Os projetos exaltam as premissas da ONG “Escola Sem Partido”, dirigida pelo advogado Miguel Nagib, “mentor intelectual” da empreitada. O site da ONG apresenta artigos de figuras como Rodrigo Constantino, Olavo de Carvalho, Luís Felipe Pondé e Reinaldo de Azevedo, cuja identidade político-ideológica é reconhecida e assumida. Nagib também é articulista do Instituto Millenium, conhecido espaço de organização, articulação e elaboração da direita brasileira, que reúne as mencionadas figuras e representa interesses políticos e econômicos mais que evidentes. Entre os porta-vozes de seus ideais estão políticos de partidos como PSDB e DEM (1).

O site do Instituto traz um interessante artigo sob o título Por uma escola que promova os valores do Millenium, datado de agosto de 2009. O texto defende que as escolas promovam os princípios particulares dessa organização, como, por exemplo, a filosofia da propriedade privada e da meritocracia, que estão bem distante de serem consensos históricos e, principalmente, “apartidários”. O mesmo artigo destaca, inclusive, cinco itens que considera “deveres do professor”... Surpresa! Esses itens vêm sendo apresentado dentro dos PLs encaminhados nas casas legislativas Brasil afora.

Cai a máscara e fica nítido, então, que o projeto não é “Escola Sem Partido”, mas sim, “Escola Com O Partido Deles”.

O PL da Mordaça

Conhecendo desde já essa profunda contradição de origem, vamos examinar atentamente o texto do projeto.

O artigo 1º já anuncia o festival de horrores que se seguirá: “assegurar os princípios e diretrizes do ‘Programa Escola Sem Partido’”. Ou seja: o PL pretende estabelecer para a Educação no DF princípios e diretrizes formulados por uma ONG identificada com o Instituto Millenium.

O artigo 3º traz os “deveres do professor” que um artigo desse Instituto já antecipara há 6 anos, conforme vimos. Chama atenção o inciso V: “[o professor, o coordenador e a direção] deverá (sic) abster-se de introduzir, em disciplina obrigatória, conteúdos que possam estar em conflito com as convicções religiosas ou morais dos estudantes ou dos seus pais”. O texto proíbe, por exemplo, que um professor ou professora explique para sua turma a Teoria da Evolução de Darwin, caso haja ali um estudante cujos pais defendem o Criacionismo.

No parágrafo único do artigo 4º, o projeto determina que cartazes com os tais deveres do professor sejam afixados nas salas de aula. Mais uma violência desferida contra uma categoria que luta muito para defender a escola pública e a Educação como direito de todos e todas. A humilhação contida em tal gesto reside na afirmação implícita, que permeia todo o projeto de lei, de que professores e professoras são entes potencialmente nocivos, que exercerão seu poder sobre os estudantes para manipulá-los e impô-los suas ideias particulares. Como se não trabalhassem com conteúdos científicos. Como se sua prática cotidiana não se baseasse em premissas pedagógicas e metodológicas. Como se não vivenciassem todos os dias dezenas de violências à liberdade de ensinar, muitas vindas do próprio GDF, outras, inclusive, vindas de estudantes e outros membros da comunidade escolar.

Na justificativa do PL, Sandra Faraj afirma que a razão de ser do projeto é a necessidade de “informar” aos estudantes o direito deles de não serem “doutrinados” por seus professores. Para isso, propõe que estes sejam fiscalizados.

O PL da Mordaça em âmbito federal

No PL 867/2015, que tramita na Câmara Federal sob autoria do deputado Izalci, o desrespeito e o autoritarismo com que são tratados professores e professoras estão expostos de forma ainda mais completa.

No parágrafo 2º do artigo 3º, o nobre deputado propõe que “as escolas deverão apresentar e entregar aos pais ou responsáveis pelos estudantes material informativo que possibilite o conhecimento dos temas ministrados e dos enfoques adotados”. Isso quer dizer censura prévia de conteúdos. Anteriormente, citamos como exemplo a Teoria da Evolução. A perigosa brecha que o PL abre pode impedir os estudantes de terem acesso ao conhecimento nas mais diversas disciplinas. E se as aulas de História não puderem abordar o Holocausto? E se as aulas de Geografia não puderem discutir as crises econômicas e militares no Oriente Médio? E se Carlos Drummond de Andrade for considerado inadequado para aulas de Literatura Brasileira? Por que o deputado Izalci quer restringir o acesso de crianças e adolescentes ao conhecimento produzido ao longo da história do Brasil e da humanidade?

Entre os famigerados “deveres do professor”, o PL da Mordaça Federal traz um item a mais em relação ao projeto apresentado no DF. O inciso VI do artigo 4º ameaça responsabilizar o professor ou professora pela ação de terceiros: “[o professor] não permitirá que os direitos assegurados nos itens anteriores sejam violados pela ação de terceiros, dentro da sala de aula”. Daí infere-se que desde um recado do Grêmio Estudantil até um debate de ideias entre alunos poderá incorrer na responsabilização do professor ou professora, caso o conteúdo do recado ou do debate não esteja de acordo com as opiniões do deputado Izalci.

Os próprios proponentes do PL assumem que a intenção de responsabilização de professores e professoras não pretende se restringir à fiscalização e à censura, o que já seria suficientemente grave. Nos textos publicados no site da ONG Escola Sem Partido, mencionam-se processos civis por danos morais e punições administrativas como forma de coagir docentes.

A gravidade da proposta é tamanha, que ela pode influenciar a proposição de projetos ainda mais terríveis. O deputado federal Rogério Marinho (PSDB/RN), por exemplo, apresentou à Câmara Federal, há poucas semanas, um PL que pretende criminalizar e colocar sob pena de reclusão o que ele classifica de “assédio ideológico”. Mais uma vez, o alvo é o Magistério.

Conclusão

Sob a falsa alegação de evitar “doutrinação ideológica” nas escolas, os PLs de Sandra Faraj e Izalci pretendem, na verdade, estabelecer uma mordaça para professores(as) e uma rédea para estudantes, a fim de, justamente, promover sua própria doutrinação. O projeto é uma nítida afronta à liberdade de ensinar e à liberdade de aprender, garantidas na Constituição Federal, uma vez que propõe censura prévia de conteúdos e coação da atividade docente.

Para atingir seu objetivo, esses parlamentares pretendem interferir no trabalho de professores e professoras, colocando-o sob suspeição e permanente ameaça. Mais um fator de deterioração das condições de trabalho da categoria, já tão prejudicadas pelos graves ataques que seus direitos têm sofrido nos últimos meses.

As escolas devem formar cidadãos críticos, aptos a formar sua visão de mundo de maneira autônoma, livre da imposição do mercado ou de religião X, Y ou Z. Democracia pressupõe pensamento livre, e pensamento livre pressupõe livre acesso ao conhecimento. É isso que os PLs 01/2015 e 867/2015, respectivamente em tramitação na Câmara Legislativa do DF e na Câmara Federal, querem destruir.

Todas as justificativas relativas à apresentação desses projetos trazem em si um indissociável autoritarismo, ao outorgar-se a prerrogativa de definir o que os estudantes podem ou não saber, e o que os professores podem ou não ensinar. Mais do que isso, referem-se com desprezo e preconceito à atividade de professores e professoras, ignorando que são profissionais que frequentaram as universidades; que se dispõem a jornadas de trabalho estafantes; que procuram se aperfeiçoar em pós-graduações, cursos e vivências; e que se mantêm em permanente processo de formação. Sugerir que tudo isso tem o objetivo de promover doutrinação e manipulação é um insulto descabido, que demonstra o desconhecimento dos autores de tais projetos sobre os processos pedagógicos, o dia-a-dia das escolas e a rotina do Magistério.

No entanto, mais uma vez, a Educação não se calará. Que seja feito o debate público, livre de amarras, censuras e truculência. Com certeza, todo o Distrito Federal rejeitará a mordaça que querem impor à categoria.



(1)  O Fórum da Liberdade 2015, evento organizado pelo Instituto Millenium anualmente, contou com a presença do senador Ronaldo Caiado (DEM/GO) como palestrante no painel sobre “Caminhos para o Brasil”. Em 2014, o então pré-candidato à Presidência da República Aécio Neves (PSDB/MG) foi palestrante no painel sobre “Competitividade”. As referidas programações encontram-se disponíveis no site do Instituto.

quinta-feira, 12 de março de 2015

Eu vou pra rua

Nesta sexta-feira 13, eu vou para a rua.

Vou me sentindo em casa, porque eu sempre estive nela e ela sempre esteve em mim. Nas ruas, eu já estive para resistir, para exigir avanços e para comemorar vitórias. Já apanhei da polícia, já tomei chuva, gritei incontáveis palavras de ordem, abracei, corri, senti medo e alegria.

Vou com a consciência tinindo, porque tenho opiniões e ideias de solução para os problemas que todos sentimos. Não é de hoje que afirmamos que a Reforma Política é fundamental para oxigenar o sistema político-eleitoral brasileiro e para combater a corrupção e a privatização da política. Só não entendo por que a massa cheirosa indignada não chega a essa brilhante conclusão. Não sei se o que querem mesmo resolver o problema. Parece que não.

Vou porque eu votei na Dilma para aprofundar as mudanças de paradigma econômico e inversão de prioridades, não para retroceder à política econômica do adversário derrotado e birrento. Vou pra rua rejeitar as políticas de ajuste fiscal e as MPs 664 e 665, que querem flexibilizar direitos conquistados a duras penas pelos(as) trabalhadores(as).

Vou porque eu também morri em cada pessoa morta, torturada desaparecida num triste passado recente que alguns teimam em querer nos fazer esquecer justamente pelo apreço e falta de vergonha que sentem por sua participação naquilo. Vou porque a democracia é nossa essência, e as ruas ardentes são a prova disso. Vou para defender a democracia como quem defende a própria vida, para que não me matem outra vez.

Vou porque eu acho uó essa indignação seletiva de gente que tá #xatyada com o esquema que vem sendo desmantelado na Petrobras, mas não fica triste com as dezenas de CPIs natimortas em SP, com a impunidade de certos processos de corrupção em Minas Gerais, com o coronelismo que segue manipulando, violentando e até matando gente Brasil afora, em pleno século XXI.

Eu vou pra rua com muito amor e convicção. O ódio, meus amigos e amigas, nunca foi um bom conselheiro. Deixa a gente meio irracional, sabem?


sábado, 28 de fevereiro de 2015

Professoras e professores em luta no Distrito Federal

Fotos do Sinpro-DF

No mesmo dia em que dez mil professores e professoras decidiram, em assembleia, indicar greve para 9 de abril - data em que deve ser percebido o pagamento do reajuste à categoria, de acordo com a lei 5.105/2013 -; o Ministério Público se prestou ao lastimável papel de acionar a Justiça para impedir que tal reajuste seja pago. A tese é de que falta previsão orçamentária para honrar os compromissos assumidos pelo GDF.

Por sua vez, o Correio Braziliense apresenta essas informações de forma tendenciosa e sem o devido rigor na apuração. O texto nitidamente coaduna com a ação do MP, e atribui a concessão dos reajustes e a aprovação do plano de carreira à necessidade de parlamentares e do então governador de "capitalizar" a decisão. Nenhuma abordagem poderia ser mais rasa.



Ora, não é necessária memória de muitos gigabytes para recuperar a histórica greve dos professores e professoras em 2012. Cruzaram os braços por 52 dias, acamparam na Praça do Buriti e o enfrentamento com o GDF chegou a momentos de tensionamento extremo, como quando da ocupação de salas do sexto andar do Palácio e da interrupção das negociações por parte do governo.

Sendo assim, também não precisa de muitas habilidades de análise política para relacionar as coisas e saber que a conquista do plano de carreira foi vitória de uma árdua mobilização dos professores e professoras do Distrito Federal, não um presente concedido ou uma iniciativa eleitoreira.

Não que eu ache que o Ministério Público tenha chegado sozinho a essa "ideia". Mas, convenhamos: na ocasião, um amplo debate público foi realizado, seja via imprensa, seja via o diálogo direto da categoria com a comunidade escolar e a população em geral, seja via iniciativas institucionais, como audiências públicas. A greve contou, inclusive, com a solidariedade do então senador Rodrigo Rollemberg, registrada em discursos que podem ser conferidos em seu site(1). Onde estava o Ministério Público em todas aquelas ocasiões? Por que somente dois anos depois da aprovação da lei 5.105 ele apresenta esse questionamento?

Surpreendente não é. A mesma Justiça que não titubeou ao declarar ilegal a mobilização dos professores e professoras, permitindo corte de ponto e impondo severa multa ao sindicato; é a mesma que mantém sem encaminhamento a ação do Sindicato dos Professores no TJDFT em relação ao pagamento dos atrasados. Ou seja: deixar os professores sem salário não é ilegal; mas mobilizar-se para garantir esse direito, sim.

A mim, tranquiliza notar, nessa história toda, que o Sinpro-DF nunca fugiu do embate com qualquer governo. Não vai ser a Justiça que vai intimidar essa aguerrida categoria dos professores e professoras.



(1) "Isso não pode fazer parte de uma negociação, isso é uma obrigação de o Governo pagar essas questões". - extraído do discurso de R. Rollemberg proferido no Senado em 19 de abril de 2012.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Práticas antissindicais, perseguição e censura

Na contramão do sindicalismo combativo, e resumindo suas ações ao corporativismo puro e simples, sindicatos de jornalistas de diversos estados brasileiros têm promovido perseguições e chantagens contra organizações sindicais ou da esquerda de maneira geral, pela demissão de jornalistas, trabalhadores dessas instituições, que não tenham sua formação específica em jornalismo.

Esse é um bom lead para uma matéria que visa a informar o que alguns sindicatos de jornalistas vêm fazendo para impedir jornalistas de trabalhar.

Eu sei de situações revoltantes no Rio Grande do Sul, em São Paulo e no Rio de Janeiro. Goste o sindicato de jornalistas ou não, esses profissionais estão exercendo sua profissão legalmente, a despeito do corporativismo raso da intervenção desse movimento “pró-diploma”, que se diz “pró-regulamentação”, mas não é.

Em vez disso, a ação tem sido reforçar o discurso de que a qualidade do jornalismo depende da formação universitária específica (premissa muito fácil de se contrariar). Os sindicatos de jornalistas não querem sindicalizar os trabalhadores que exercem sua profissão sem o diploma específico. Não querem protegê-los de abusos e violações de direito. Querem ser mais um agente na precarização do trabalho desses, ao que tudo indica.

A história chega ao cúmulo de plenárias de forças políticas apreciarem a situação de funcionário cuja cabeça está sendo pedida pelo sindicato de jornalistas. Em alguns lugares, eles ameaçam de retaliação a instituição empregadora, ou em outros, sugerem que vão expor o trabalhador ou trabalhadora a constrangimentos. Às vezes, são as duas coisas combinadas. Mas isso não é assédio moral? Ou é bancar a polícia?

Se uma central sindical é solidária à luta corporativa dos sindicatos de jornalistas em defesa da reserva de mercado, jamais poderá ser condescendente com práticas de assédio moral ou com a subordinação preconceituosa de determinados(as) trabalhadores(as) a critérios absolutamente controversos.

Outro dia, chegou até mim a boataria, pela boca de colegas não tão próximos da vida sindical. Um jornalista, cujo nome protejo, disse: “Eu soube que tal lugar contratou jornalista sem diploma! O nome do dito-cujo é Fulano!”. O coitado do Fulano ficou assustado com a repercussão de um assunto que é, simplesmente, seu trabalho cotidiano há mais de dez anos. E então, cria-se um cordão de isolamento em torno da pobre criatura... tratada como criminosa, como se fosse um traficante de animais selvagens, sei lá.

Além de serem repudiáveis as práticas recentes encaminhadas pelos sindicatos de jornalistas de alguns estados, há que se reforçar que a opinião deles NÃO é um consenso. A cruzada deles pela reserva de mercado NÃO é a opinião de toda a esquerda, NÃO é a opinião de todos os que trabalham. É preciso romper com esse falso consenso que paira no ar, que, muitas vezes, justifica essas ações de perseguição, preconceito e anti-sindicalismo que se vê por aí.

Ass: Adelaide de Julinho

sexta-feira, 3 de abril de 2009

Nota dos(as) diretores(as) da CUT à direção do PT

Ao Partido dos Trabalhadores;
À Presidência Nacional do Partido dos Trabalhadores;
À Secretaria Geral Nacional do Partido dos Trabalhadores;
À Secretaria Nacional de Mulheres do Partido dos Trabalhadores.


Prezadas Companheiras e Companheiros do Partido dos Trabalhadores,

Por entender que as mulheres devem ter autonomia e liberdade para decidirem sobre suas vidas e seu destino, nós, militantes do Partido dos Trabalhadores e Dirigentes Nacionais da Central Única dos Trabalhadores temos posicionamento a favor da legalização do aborto.

Sabemos que a luta pela legalização do aborto em nosso país não é simples, mas no sentido de avançarmos, temos conseguido traçar caminhos de solidariedade dentre diversos movimentos e partidos, especialmente entre as companheiras e companheiros do Partido dos Trabalhadores.

Estamos passando por uma forte ação conservadora contra a autonomia das mulheres, a partir da iniciativa de grande parte da Igreja Católica, que tem encontrado sua representação no Congresso Nacional. Dentre destes, estão Luís Bassuma (PT BA) e Henrique Afonso (PT AC).

O Partido dos Trabalhadores, em seu III Congresso Nacional aprovou posição favorável a legalização do aborto. Sendo assim, exigimos o cumprimento das resoluções aprovadas democraticamente em nosso congresso.

Por isso, manifestamos nosso total apoio às Mulheres do PT que protocolaram, a partir da Secretaria Nacional de Mulheres do PT, na Secretaria Geral do Partido, o pedido de instauração de Comissão de Ética para os deputados Henrique Afonso e Luís Bassuma.

Defendemos que o Estado deve ser laico e pautado por valores de justiça, igualdade e solidariedade e rechaçamos qualquer tentativa de imposição de crença e valores religiosos.

Nenhuma mulher deve ser morta, humilhada ou perseguida por realizar aborto. Repudiamos a tentativa de instalação de CPI no Congresso Nacional que irá ampliar a criminalização das mulheres que precisam recorrer ao aborto.

Temos a certeza de que a legalização do aborto é parte da construção de uma sociedade que seja de fato justa e igualitária que tanto nós quanto o PT queremos construir.

Saudações Petistas,

Artur Henrique – Presidente da CUT Nacional
Rosane Silva – Secretária Nacional da Mulher Trabalhadora da CUT
Carmen Foro – Vice Presidente da CUT
Quintino Severo – Secretário Geral da CUT
Adeilson Telles – Primeiro Secretário da CUT
Jacy Afonso de Melo – Tesoureiro da CUT
Antonio Carlos Spis – Primeiro Tesoureiro da CUT
João Antonio Felício – Secretário de Relações Internacionais da CUT
Vagner Freitas – Secretário de Política Sindical da CUT
José Celestino Lourenço – Secretário de Formação da CUT
Rosane Bertotti – Secretária de Comunicação da CUT
Expedito Solaney – Secretário de Políticas Sociais da CUT
Denise Motta Dau – Secretária de Organização da CUT
Dary Beck Filho – Diretor Executivo da CUT
Elisângela dos Santos Araújo – Diretora Executivo da CUT
Júlio Turra – Diretor Executivo da CUT
Lúcia Reis – Diretora Executiva da CUT – Escritório Brasília
Manoel Messias – Diretor Executivo da CUT
Milton Canuto – Diretor Executivo da CUT
Rogério Batista Pantoja – Diretor Executivo da CUT
Adriano Soares da Silva – Coordenador do Coletivo Nacional de Juventude da CUT
Marcos Benedito – Coordenador da Comissão Nacional Contra a Discriminação Racial da CUT
Shakespeare Martins de Jesus – Coordenador da Comissão Nacional de Meio Ambiente da CUT

São Paulo, 2 de abril de 2009.

segunda-feira, 30 de março de 2009

A nossos(as) eleitores(as) e apoiadores(as), muito obrigado!

Mensagem da chapa 2, que disputou o Sindicato dos Jornalistas de SP.

Encerrado o processo eleitoral no Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo, nós, membros da Chapa 2, "Enfrentar a Crise, Sindicato é Pra Lutar!", agradecemos a todos/as aqueles/as que con fiaram na nossa disposição de luta e nosso Programa e apostaram na proposta de renovação do Sindicato. Não conseguimos vencer, mas reafirmamos nesta campanha a grande vitalidade da Oposição e o respaldo que continua a merecer na maioria das grandes redações.

Nesta eleição, 1.168 jornalistas tiveram seus votos validados.

A Chapa 2 recebeu 515 votos, 44% dos votos válidos. A Chapa 1, da situação, recebeu 653 votos, 56%.

Apesar da derrota, a Chapa 2 foi a mais votada na capital: somadas as urnas 1 (sede) e 2 a 6 (volantes), recebemos 303 votos, mais do que os 283 votos recebidos pela Chapa 1.

É um resultado histórico, que indica a existência de uma crescente insatisfação dos/as jornalistas com a apatia e o abandono que vitimam nosso Sindicato. Insatisfação que não se manifesta apenas nas redações, mas também é encontrada entre assessores/as de imprensa e colegas aposentados/as.

Nas regionais, bem como na urna de votos por correspondência, fomos derrotados. Mas vencemos em Bauru (34 x 19) e obtivemos resultados importantes em Piracicaba (14 x 15), Sorocaba (17 x 20) e Santos (43 x 78).

Continuaremos batalhando para fortalecer nosso Sindicato e dar-lhe um perfil combativo, capaz de defender a categoria da ganância dos patrões e de torná-lo um protagonista atuante na sociedade brasileira, em especial na luta pela democratização das mídias. Para tanto, a sindicalização de milhares de jornalistas é um passo indispensável.

Como temos feito ao longo dos últimos anos, procuraremos, com a ajuda da categoria, fiscalizar a diretoria eleita e exigir que cumpra seus compromissos de campanha, além de prestar os esclarecimentos necessários quanto a denúncias recentes que ainda não foram respondidas satisfatoriamente.

A tod@s que nos apoiaram, reiteramos nosso muito obrigado!

Chapa 2, "Enfrentar a Crise, Sindicato é Pra Lutar!"

segunda-feira, 23 de março de 2009

Jornalistas: sindicato é pra lutar!

ELEIÇÕES 24 a 26 de MARÇO
Conheça mais: www.sindicatopralutar.com.br


O Movimento Sindicato é Pra Lutar! foi criado em abril de 2002, reunindo profissionais que, inconformados com os rumos tomados pelo Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, decidiram organizar-se com a finalidade de levar a categoria a refletir sobre a difícil situação da entidade, e a agir para superar a crise.

Sabíamos que qualquer mudança real no Sindicato dependeria de uma nova atitude dos colegas. Pois o Sindicato só retomará uma posição mais combativa em defesa dos interesses e direitos dos jornalistas, só cumprirá seu papel, quando for reconquistado por aqueles que trabalham nas redações de jornais e revistas, nas emissoras de televisão e rádio, portais da Internet, assessorias de imprensa.

Vários dos que se engajaram na iniciativa haviam participado, nas eleições de março de 2000, da Chapa 2-Sindicato Vivo, que só foi derrotada porque a Chapa 1, da Diretoria, praticou todo tipo de manobra antidemocrática: preencheu sozinha todas as vagas da comissão eleitoral, nomeou todos os mesários, ofereceu vacinação gratuita aos sócios nas datas da eleição (e no recinto de votação) e ainda lançou um plano de saúde eleitoreiro (o PSS) — que garantiu a vitória do grupo situacionista, mas quebrou financeiramente a entidade.

Em março de 2003 o Sindicato passou por um novo processo eleitoral. Mas, desta vez, o grupo que controla a entidade não quis correr nenhum risco. A Chapa 2, apresentada por nós, não conseguiu sequer inscrever-se, embora contasse com nada menos do que 54 jornalistas de dez cidades diferentes. Foi impugnada sob o pretexto de que não apresentara candidatos para a diretoria regional de Piracicaba — que, à época, simplesmente não existia como tal, pois não possuia sede, endereço, telefones ou mesmo filiados em número suficiente para formar chapas.

Nem por isso nosso coletivo desistiu. Pelo contrário, continuou a participar de todas as atividades importantes para o Sindicato e para a categoria. Logo após as eleições, o fatídico plano de saúde encerrou de modo drástico as suas atividades, tal como havíamos previsto, deixando uma dívida imensa para a entidade e prejuízos para centenas de usuários.

Nossa atuação nas assembléias orçamentárias, que discutem a aplicação dos recursos financeiros do Sindicato, tem-se pautado pela apresentação de propostas alternativas, que contemplam a necessidade de modificar o sistema de financiamento da entidade (abolindo as taxas compulsórias e implantando a mensalidade proporcional aos salários) e — ao mesmo tempo — procuram reorientar a aplicação dos recursos. Estamos exigindo que a Diretoria cumpra o dispositivo do Estatuto do Sindicato que resguarda os interesses da categoria em dotações específicas (rubricas) para as atividades de campanha salarial e negociação coletiva, campanha de sindicalização e outras.

Temos participado também de todas as campanhas salariais, desde as assembléias que definem a pauta e o planejamento até, na condição de membros eleitos das comissões de mobilização e negociação, a própria execução das atividades. Desta forma, estamos contribuindo, em alguma medida, com a luta que a categoria vem travando, a cada data-base, para manter o poder de compra de seus salários, diante da voracidade dos patrões. Infelizmente, a Diretoria prima por descumprir a linha das campanhas salariais e as ações definidas em assembléia.

Vamos continuar brigando, guiados pelos princípios históricos da Central Única dos Trabalhadores, tais como a independência frente aos patrões e frente aos governos, a necessidade de organização no local de trabalho, a defesa intransigente dos interesses dos trabalhadores contra a exploração praticada pelos empregadores — exploração que, no setor de comunicação, assumiu proporções de um verdadeiro massacre.

Queremos participar das próximas eleições, que ocorrerão em março de 2006, para que os jornalistas tenham o direito de escolher uma alternativa ao grupo que está à frente do Sindicato há 15 anos e que, nesse período, conseguiu produzir desfiliações em massa e o maior desastre financeiro da história da entidade.

***
Por luta, entenda-se: resistir às arbitrariedades e imposições dos patrões, assumir a liderança dos protestos, informar amplamente a categoria, convocá-la, representá-la como porta-voz de suas reivindicações legítimas. Em resumo: enfrentar o arrocho salarial, as jornadas excessivas, as péssimas condições de trabalho, as demissões, o desemprego.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

CUT condena a iniciativa de instalação da CPI do aborto

(nota da CUT sobre a bizarrice de que falamos nos últimos 2 dias neste blog)

A notícia de que a Câmara Federal está prestes a instaurar uma "CPI do Aborto" nos causa surpresa e indignação.

Há poucos meses, na Comissão de Seguridade Social e Família desta Casa, os mesmos parlamentares que ora apresentam o requerimento para instauração desta CPI, furtaram-se em aprofundar o debate acerca do tema e orquestraram a votação que derrotou, naquela Comissão, o Projeto de Lei que propunha a descriminalizaçã o do aborto (PL 1.135/91). Já faz alguns meses também, que a Justiça do Mato Grosso do Sul vem investigando mais de 1.200 mulheres, acusadas pela prática de aborto ilegal naquele estado.

Que esses fatos devam ser objeto de interesse e ação do Poder Legislativo, não resta dúvida.

Para além das 400 mil mortes anuais e dos inúmeros atendimentos realizados pelo SUS em decorrência de abortos mal sucedidos, a criminalização das mulheres, que estão tendo suas vidas devassadas pela ação do Poder Judiciário, constituem sim base material para que o Estado Brasileiro realize uma profunda reflexão sobre o papel que deveria cumprir na vida dessas mulheres.

Poderíamos começar realizando um profundo diagnóstico dos sistemas de saúde pública, educação e previdência, para entender por que a maioria das mulheres brasileiras não tem condições de decidir ou planejar uma gravidez, e para avaliar até onde o Estado tem assumido sua cota de responsabilidade na reprodução da vida, para que as mulheres possam optar pela maternidade sem precisar abrir mão de outros projetos pessoais.

Poderíamos também aprofundar o debate sobre o necessário enfrentamento à desigualdade de gênero e à violência doméstica, que expõem as mulheres à gravidez indesejada.

E, principalmente, deveríamos retomar o princípio da laicidade do Estado, para que o diagnóstico e a solução desse grave problema social não sejam contaminados por convicções morais ou religiosas.

É preciso sim que o Brasil reconheça a existência da prática de aborto em nosso país, mas que questione as causas que vieram a configurar essa dura realidade e apresente uma solução. A condenação de mulheres que praticaram aborto só causará mais mortes.

A maternidade implica muitas mudanças no aspecto físico e emocional da gestante, e em seu projeto de vida naquele momento. Por isso, a gravidez não pode ser imposição, castigo ou obrigação; deve ser uma decisão da mulher. Ainda neste ponto, cabe questionar o porquê de a responsabilidade paterna ser tão pouco abordada nos tradicionais debates sobre a questão.

Há tempos exigimos que as mulheres tenham atendimento integral à sua saúde, o que exigirá também mudanças no mundo do trabalho, pois o envolvimento das empresas com esse compromisso será essencial para as trabalhadoras. A interrupção de uma gravidez é uma circunstância altamente desconfortável e, muitas vezes, traumática para as mulheres.

Defender a legalização do aborto não significa, portanto, que as mulheres pretendam recorrer à sua prática como método contraceptivo. Trata-se de combinar a legalização do aborto com a ampliação do acesso das mulheres à informação, aos métodos contraceptivos e de criar condições para que elas negociem o uso de preservativos com seus companheiros de forma tranqüila, o que, muitas vezes, não ocorre. A interrupção da gravidez indesejada deve ser o último recurso. Em diversos países onde houve a legalização, os números provam que os casos de aborto não aumentam por conta da situação de legalidade.

Estamos falando, aqui, de um mecanismo de direito de liberdade da mulher sobre seu próprio corpo. Nossa vida está em constante risco pelo fato fundamental de sermos mulheres. Trata-se de construir um mundo de igualdade, o que não é possível enquanto existir tantas mulheres trabalhadoras, desempregadas, pobres, negras, jovens morrendo ou sendo presas por não terem direito de decidir sobre seus próprios corpos e seu destino.

A criminalização de um assunto que levanta questões tão polêmicas leva a um tipo de autoritarismo e fundamentalismo que não fazem bem a uma sociedade democrática e pluralista. Enquanto o mundo discute a questão do aborto sob a ótica civilizatória e democrática, o Parlamento brasileiro discuti-lo sob a ótica criminal, através de uma CPI, seria um retrocesso inaceitável após 60 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos e 20 anos de Constituição Cidadã no Brasil.

Por isso, nós, homens e mulheres da classe trabalhadora, rechaçamos com veemência a proposta de instauração desta CPI e reafirmamos nosso compromisso de luta pela legalização do aborto, em defesa de uma vida mais digna e de um mundo mais justo para todos e todas.
São Paulo, 11 de dezembro de 2008

Artur Henrique, presidente nacional da Central Única dos Trabalhadores
Rosane da Silva, secretária nacional sobre a Mulher Trabalhadora