quarta-feira, 16 de julho de 2014

Sobre os secadores, os intolerantes, os babacas e o que a mídia tem a ver com tudo isso

 

Estou absolutamente embasbacada com a quantidade de estupidezes anti-Argentina que inundaram a minha TL nos últimos dois dias. Acho bastante triste que um dos legados desta sensacional Copa do Mundo seja o acirramento idiota de uma intolerância injustificável entre brasileiros e argentinos. Vejam que eu cuidei bem da palavra a ser usada: INTOLERÂNCIA não é rivalidade.

Estive em Buenos Aires duas vezes. Meu pai assistiu às finais da Copa de 1998 lá. Tenho amigos e amigas que vivem, viveram ou viverão lá. Tenho amigas e amigos argentinos que vivem aqui. É com base nessa experiência que desde que me conheço por gente acho essa "rivalidade" uma babaquice, sabe por quê? Porque sempre me pareceu que ela faz mais sentido pra nós que pra eles. E não precisa me dar exemplo do fulano, do beltrano ou do ciclano pra me contradizer. Poupe seu tempo.

Nunca embarquei nessa. Ao contrário, sempre me incomodaram as propagandas monotemáticas de época de Copa, reafirmando essa palhaçada; sempre me incomodou a abordagem de boa parte do jornalismo, alimentando essa palhaçada; sempre me incomodaram as exclamações galvãobuenescas dramatizando essa palhaçada.

No dia seguinte da derrota vexaminosa que o Brasil sofreu para a Alemanha, uma repórter da SporTV suspirava: "É... Agora é torcer contra os 'hermanos'". Não sei se fui só eu, mas achei de uma idiotice milenar. Afinal, é a naturalização da palhaçada. Tornou-se automático de tal forma, que o Lancenet!, do qual deixei de ser leitora, cobriu a final da Copa do Mundo no twitter com a hashtag ‪#‎SomosTodosAlemanha‬. Quando os questionei, recebi a seguinte resposta: não somos isentos, somos brasileiros antes de tudo.

Ser brasileiro tornou-se sinônimo de ser anti-Argentina para essa mídia tosca e semeadora de toda espécie de ódio e rancor. Eles mesmos: esse jornalismo esportivo de merda que alguns fazem por aqui - tomando cuidado para evitar generalizações, afinal, nem todo veículo embarca nessa linha editorial de merda e nem todo(a) repórter compra essa abordagem de merda -, e essa publicidade de quinta categoria, que tem a criatividade de um caramujo.


Eu lhes afirmo que essa richa boba faz mais sentido aqui que lá. E se você espernear e contestar e achar um absurdo e contar do dia que você encontrou um argentino na rua e não foi bem assim, tudo bem. Eu responderia: mesmo que fosse uma coisa mútua, de mesma dimensão de lado a lado, ainda é muita cretinice permitir que uma rivalidade de futebol ultrapasse os limites da brincadeira com o esporte.

A torcida anti-Argentina por parte de alguns era tão voluptuosa quanto num clássico brasileiro. Estou certa de que os hermanos não esperavam essa rejeição toda. Mas o pior vem depois: eu realmente temo que, finalmente, como tanto provocou a mídia brasileira, ela se torne visceral de lado a lado.

Cada um torce pra quem quiser. Não estou cobrando nada de ninguém. Nunca usei o argumento da solidariedade latinoamericana, afinal, minha solidariedade é tão grande que eu a distribuo a baciada pelo mundo, e, no futebol, eu a dedico aos holandeses, que são europeus, ricos, e nunca ganharam uma Copa, como vocês sabem. Eu torci para a Argentina na final por causa do Messi. Tem gente que torceu por solidariedade latina, e tá certo também, cada um com seus critérios. Teve gente que não queria a Alemanha campeã por nos ter imposto tamanha humilhação nas semis. E teve gente que torceu para a Alemanha por x, y, z também. Tranquilo. A questão é: como ouvi de um jovem advogado argentino outro dia, eu também não entendo como num campeonato de seleções nacionais alguém saia de casa para torcer contra o time do outro. Percebam: não a favor de um, mas contra o outro. E com tanta raiva.

Ah, mas eles fizeram uma musiquinha escrota contra nós! Gente. Quase tenho vontade de cantar música de ninar pra quem se ofendeu com a musiquinha. Eles reivindicam a Copa de 90, que nem ganharam, e desde a qual o Brasil foi campeão duas vezes. Se eu fosse você, eu ria da musiquinha enquanto tomava uma boa gelada no bar.

Ah, mas eles dizem que Maradona é melhor que Pelé! - Putz, fodeu. Vamos ter que tratar disso no Tribunal de Haia.

Ah, mas eles são arrogantes! - Essa é a melhor. Porque é tipo o roto falando do rasgado, como dizia a minha avó. Afinal, humildade não é propriamente uma das habilidades do futebol brasileiro, torcida inclusa.

Ah, mas eles são racistas! - Ok, fale mais sobre como é torcer para a Alemanha com essa justificativa.

Enfim, só peço que pense um pouquinho se essa intolerância toda faz sentido, ou se você não foi contaminado por um clima que "alguém" inventou com uma única intenção: vender produtos e jornais. A crítica aqui é mais à mídia que a você, mas se você quiser vestir a carapuça também, tranquilo. Só não me responda com a mesma raiva que jogaram sobre nossos vizinhos do Cone Sul, porque eu moro aqui, você vai acabar me encontrando e eu vou te desafiar para um duelo de musiquinhas do qual somente um sairá com a honra intacta.


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