sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Fábrica de preconceitos com roupagem intelectual

Reproduzo, abaixo, carta que a socióloga feminista Maria Lúcia Silveira enviou à ombudswoman da Folha de S. Paulo, a respeito de lastimável artigo publicado por esse jornal no último domingo (mais uma da Folha, aliás), assinado por um tal de Pondé. Sei lá eu quem é esse senhor. Nem me interessa saber. Mas seu artigo "misógino e vulgar", como disse Maria Lúcia, despertou reações.

Boa leitura.


Caríssima Ombudswoman

Qual sua posição sobre os impropérios constantes sobre as mulheres que pensam (e segundo eles, isso as torna peludas e feias) do colunista L.F. Pondé?

Dei até um tempo, evitei ler mais suas baixarias misturadas a citações de alguma antifeminista americana ou de algum filósofo sensível como Benjamin ( que deve ter se revirado no túmulo) pra ancorar o vômito de sua misoginia vulgar.

Mas desta vez, sua última coluna extrapolou! Não tinha lido, mas algumas amigas me passaram e achei um pouco demais. Se ele discute com seus alunos essa linda e profunda visão de mundo, coitados dos alunos da FAAP e PUC. É um pseudo-intelectual que deve ser fruto dessa delinquência acadêmica que coloca os seus em destaque. Por que não põem como colunista a profa Márcia Tiburi, hoje no Mackenzie? Uma mulher bonita, inteligente, vivaz e não peluda (como reproduz o senso comum machista) no seu auge.

Não precisa ter título acadêmico pra escrever a máquina de preconceitos sociais contra as mulheres. Isso circula de graça em nosso cotidiano. Nâo tem mais nenhum Paulo Francis, não. Só arremedos. Então, se quiserem colocar um pensador de direita, ou religioso coloquem um que não exponha preconceitos com roupagem intelectual. Nesse artigo último, nem isso ele faz! É inacreditável ver no espaço de um Contardo Calligaris e de um Marcelo Coelho, esse tal de Pondé!

Infelizmente, por essas e por outras vou cancelar minha assinatura da Folha de São Paulo. Ai que saudades que tenho da época que tinha um Claudio Abramo para ler, um Perseu Abramo.

Ia escrever pro Pondé protestando, mas só se mantivesse o seu nível: teria de perguntar se ele acha que se sua filha tiver um jantar pago por um exemplar masculino da espécie ele pode levá-la pra cama sem remorso. Ou se ele quer uma filha eunuco. Mas deixa pra lá. Vou escrever no blog coletivo em que participo [blog 300] porque pelo menos sou atacada por machistas em estado puro, sem persona intelectual. Aliás, fale pra esse articulista e pra seu editor que poderiam aprender algo com o Contardo Calligaris, Jurandir Freire Costa, Joel Birman, Maria Rita Khel e outros. Bibliografia também tem demais, mas pra não citar nenhuma feminista que essa Folha tem horror, leiam um clássico: Pierre Bourdieu, em A dominação masculina, tem tradução para o português desde 1999.

Pra mim chega!

Maria Lucia da Silveira
(socióloga, militante da Marcha Mundial das Mulheres e colaboradora da SOF - Sempreviva Organização Feminista)

2 comentários:

Nessa Gil disse...

A coisa é muito pior. Esse cara só escreve esse tipo de coisa. Deveria estar preso.

Shirlei Romano disse...

Mexe tanto com o meu interior ver que as pessoas que formam opiniões, que estão reproduzindo as suas asneiras em sala de aula, tenham espaço, e audiência para tanto que ás vezes tenho vontade de gritar...Ah, mas não fico só na vontade, grito o tempo todo...Porque estas farpas não vão me atingir sem que eu me debata muito antes!

Ainda iremos ouvir muitos ecos desta matéria da folha, por aí, o núcleo de gênero que faço parte da universidade está em debate e já enviou sua carta repúdio aos editores do folhetim, digo da "grande" Folha, mas a vontade mesmo era de mandar todos eles pastarem! Porque às vezes só entendem as palavras de baixo teor moral, mas aí eu seria taxada de "heterofobica" "queimadora de sutiãs" mal amada e porque não? Peluda!