terça-feira, 27 de julho de 2010

CQC: Originalidade na expressão do senso comum

Volta e meia aparece uma "novidade" na TV, pretensamente original, imparcial, inteligente. Particularmente, poucas vezes vi uma promessa dessas se confirmar.

Na TV Band, o CQC apresentou-se com essa embalagem: formato inovador, repórteres-comediantes, abordagens interessantes para temas conhecidos. Mas, parece-me - e posso estar enganada por não ser uma telespectadora assídua -, recorre a elementos já bem conhecidos do grande público para consolidar sua audiência. Acaba, portanto, tentando fazer o novo a partir do velho. Uma contradição em termos?

No programa de ontem, houve uma mensagem de saudação à aprovação, na Argentina, do reconhecimento do casamento gay. Um repórter foi às ruas mostrar que o preconceito é firme e forte. Outra repórter entrevistou celebridades que, esboçando alguma contradição ou não, felicitaram a decisão de nossos hermanos, em defesa da livre orientação sexual. Porém, entre um quadro e outro, ou dentro de cada quadro mesmo, as piadas que desqualificam os homossexuais - como imputar ao outro o qualidade de "viado" numa tentativa de diminuí-lo, de afirmar que ele é inferior - continua dando o tom. Uma contradição em termos?

Outra. No início do programa, Marcelo Tas fazia o discurso democrático da necessidade de dar espaço a todos os candidatos que disputam a presidência da República. Para demonstrar que pratica o que prega, a repórter Mônica Iozzi entrevistou, entre outros, o candidato do PCB, Ivan Pinheiro.

Talvez a jovem repórter não faça ideia de que falava com o representante de um partido de quase 90 anos. Partido que fez parte dos principais momentos da história do Brasil nesse período, e que expressa uma tradição internacional importante. Ivan Pinheiro e o PCB foram apresentados ao lado de Eymael e Levyr Fidelix, caricatos por opção, não simplesmente por abordagem da imprensa.

A repórter destacou 3 pontos da plataforma de Pinheiro: controle social da mídia, regulamentação do sistema financeiro e a defesa de um sistema político unicameral. Referiu-se a esses temas, em especial, aos dois primeiros, como questões ultrapassadas ou malucas mesmo. O fato de o candidato ter poucos segundos para falar de qualquer um desses temas deu um tom geral de deboche, de mundo da lua.

Talvez ela - e o programa - não faça ideia de que se tratam de temas muito discutidos e aprofudados pela esquerda brasileira. Propostas reais e exequíveis, que, infelizmente, não contam com tempo na grande mídia, que discorda politicamente delas, para serem apresentadas e disputadas.

O CQC, portanto, engrossou a mesma ladainha de que controle social é censura, e que moderno mesmo é a "livre" circulação de capitais, "livre" mercado, "livre" especulação. Mostrou ignorar que qualquer processo democrático que se preze (e nem precisa ser muito de esquerda para ver) inclui um marco regulatório para a atividade da imprensa, e o contrário disso sim é que é ditadura - a ditadura da mídia, dos poucos que a possuem. Não aceitou debater a existência de um Senado, essa Casa que remete aos imemoriais tempos imperiais, e cuja atuação, não raro, é motivo de vergonha para alguns homens e mulheres sérios que ali tentam trabalhar.

O CQC tratou o candidato Ivan Pinheiro como qualquer outra emissora de TV que finge que sua candidatura não existe. Contradição?

E, assim como todo veículo da grande imprensa, reforçou um rótulo de que a esquerda é jurássica, autoritária e até engraçada por isso. O que tem de novo?

Ah, sim. A vontade de fazer tudo isso parecer original.

5 comentários:

gustavo felinto disse...

muito legal seu texto Alê! conservadorismo travestido de moderno, "cool"... mais do mesmo

Anônimo disse...

Parabéns pelo texto! demais!
Foi para twitter! Saudações!

Gabriela disse...

Parabéns pelo texto! demais!
Foi para twitter! Saudações!

André Ranieri disse...

Se alguém inventar algo "original, imparcial, inteligente", pode ter certeza que o lugar certo para veicular não vai ser na TV. Esse tipo de programa não iria fazer sucesso.

As pessoas tem que parar de tentar fazer da TV a coisa mais justa do mundo. Temos que entender que a TV foi feita para o entretenimento barato.

Mas o texto ficou realmente bom. Você se expressou muito bem.

Bruno disse...

Bom texto, porém não concordo com o que foi escrito. O CQC é um programa que trata vários assuntos com ironia e um humor diferente. É um tipo de programa, que se você não gosta desse tipo de humor, você não vai gostar do programa. Vai achar que tudo é ridicularizado. E eu não acho isso, mas é a minha opinião. Com relação aos partidos nanicos, o CQC foi o primeiro programa até agora em que esses candidatos falaram algo, ou esses caras vão participar do debate da Globo e da Band? Acho que não.