quarta-feira, 2 de abril de 2014

Trinta e um anos sem CLARA NUNES

Eu não sabia que era hoje, Clara. Não lembrava, sei lá. Prefiro guardar a data do seu nascimento, em 12 de agosto de 1942.

Eu não sei quem eu sou sem você, mesmo nunca a tendo visto em vida. Mesmo sabendo que me apareceste como um fantasma do bem, me mostrando o samba, me dando um jeito feminino de cantar forte. E como disse o nosso amigo João, tirando a preta do cerrado, pondo rei Congo no Congado...

Lembro como ontem ouvir "O Mar Serenou", uma década atrás, e pensar... Tem espaço pra ser mulher nessa história de samba. Lembro que, minutos após te ouvir, fui à beira do mar testar se eu poderia ser sereia. E graças a você, eu soube que eu sou sim, sereia.

E cada vez que o vento vem, eu peço que me traga um pouco de você... Se não sua voz, então, que me traga o que você faria, porque nada foi fácil pra você, como não é pro povo brasileiro. Mas você é guerreira, como as mulheres brasileiras são. Você sempre foi.

E, Clara, você foi Clara. Clara ficou espalhada como se tivesse sido cinzas que teu vento levou pra onde quis. Há você em cada canto deste país, onde se canta samba, onde se celebra nossa história... Tua voz ecoa que nem grito que lançaste pra demarcar justamente isso: a nossa história, que cavaste suave pra fazer brotar onde tinha que ser. Eu fui. Eu sou.



Clara, querias tanto ter filhos... Isso nunca lhe aconteceu pela biologia. Mas Clara, minha Clara, linda do meu coração: tiveste muitos filhos e filhas por este Brasil. Estamos aqui, sem seu sobrenome, pra reproduzir teu legado. Porque, para nós, é uma honra continuar.

Não tem um dia em que eu não pense... Como seria tudo isto se você estivesse aqui? Mas tu não és tristeza, nem frustração... Tu és a força da nossa bravura, tu és a beleza da nossa cultura, tu és a voz que vive pulsante em cada mulher, em cada sambista, em cada musicista... Para a gente fazer nossa cultura ser eterna, ser reinante sobre tudo... Como és tu, filha da rainha dos ventos, que, nos meus sonhos, está sempre em cada sopro de ar que vem na minha direção.

Obrigada por ter me levado ao lugar de onde eu vou contribuir mais pro mundo ser melhor. E se o mundo me diz não, meu sim vem de ti. Porque você vive sempre com a gente. E a gente fica a lembrar, vendo o céu clarear, na esperança de vê-la...

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