quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Um santo

Era um bar que ficava na Vital Brasil, bem perto da USP. Era certo que sair da faculdade e passar lá significava encontrar algum perdido ou perdida tomando uma cerveja ou só comendo um lanche mesmo. Os meninos gostavam de ir lá jogar sinuca. Quando ganhávamos alguma eleição de centro acadêmico, o endereço da festa era aquele.

O Moisés e o Bigode nos atendiam. Às vezes, davam um pacote de salgadinhos. Outra vezes tinham que nos expulsar, porque não iríamos embora livremente.

Estou triste de saber que o San Raphael vai fechar. Não é uma tristeza daquelas... “ah que pena, não vou mais poder freqüentar”. Afinal, ele tá lá no Butantã, em São Paulo, e eu, em Petrópolis, Porto Alegre. E convenhamos, mesmo que eu estivesse em São Paulo... não sou mais universitária, não moro na zona oeste, não como mais aqueles sanduíches gordurosos...

Tem uma linda crônica de Vinícius Carpinejar em que ele fala dos “amigos invisíveis”. São amigos que você tem ao longo da vida e acaba perdendo o contato. Isso não é ruim, necessariamente. Algumas pessoas são parte integrante e indissociável de um momento da nossa vida. Importá-las de um momento para o outro pode não ser bom. E não importá-las não diminui sua importância, não quer dizer que elas não fazem parte da nossa vida. Significa apenas que aproveitamos ao máximo essa amizade no momento em que isso devia ser feito.

É assim que penso no San Raphael. Imagina eu chegando lá hoje? Haveria uma dezena de estudantes da USP, bebendo, comendo, jogando sinuca, brigando, falando alto, dando risadas... como eu fiz uma vez. Mas eu não os conheceria. Não sentaria em mesa alguma apenas para jogar conversa fora, caçoar da aula que estou matando, reclamar dos contratempos do movimento estudantil... “isso não me pertence mais”. O San Raphael também não. Seria egoísmo ou síndrome de Peter Pan pensar o contrário.

É com esse espírito que estou triste porque o bar vai fechar. Os novos estudantes, os novos militantes do movimento estudantil não vão mais fazer suas reuniões secretas lá. Não vão conhecer o Moisés e o Bigode, nem vão ser obrigados a tomar Antarctica porque “é mais barato”. Aquele lugar guarda um monte de histórias do movimento estudantil. Até no dia em que, em ato político, lembramos os 30 anos da morte de Alexandre Vannucchi Leme (em 2003) – nome do nosso DCE –, foi pro San Raphael que levamos os antigos colegas dele que compareceram à atividade... E agora, essas histórias todas vão ficar enterradas lá. Não vão ficar pairando pelo ar, assombrando os novos e novas que sempre chegam.

Queria estar lá na sexta, para me despedir. Porque não posso, escrevi isto aqui. Um brinde ao San Raphael.

2 comentários:

Rafael Pops disse...

amiga, incontáveis são os bares que foram palco de muitas comemorações em nossas vidas universitárias. No meu caso passo todos os dias no postinho da UnB e relembro de tantas cervejas tomadas ali... Hj é só um posto, não pode mais vender cerveja.

São memória que construímos e que carregaremos para todos que conhecermos e que quiserem escutar nossas histórias. Certamente o Alexandre Vanucchi Leme, o Honestino Guimarães e mtos outros tiveram o seu San Rapahel, seu postinho, o bar de sua vida estudantil... E esse bares se foram, como os nossos...

Outros surgiram, o movimento estudantil seguirá e, com sorte, poderemos ir daqui uns anos beber uma cerveja no novo san raphael pra contar e lembrar do Moisés, do Bigode e de nossa intensa militância estudantil que mudou todas nossas vidas.

Léo Santos disse...

Que saudosismo hein! Mas deve ter agora, digo, atualmente, algum lugar onde tu tome a tua cervejinha e jogue conversa fora!

Um abraço!