Leia aqui as partes anteriores: UM, DOIS, TRÊS, QUATRO e CINCO.
Assim, Laís retomou sua frequência aos happy hours com amigos do trabalho. Agora, sempre maquiada, às vezes, esbanjando sorrisos artificiais como o Lago Paranoá. Havia noites que terminavam com desentendimentos públicos entre ela e Léo. Havia noites em que ela agia com um misto de displicência e desprezo. Havia noites em que ela mal olhava na cara do ex.
A separação era muito recente, era tudo muito estranho para Laís. Brasília inteira era o Léo, mesmo que ela não quisesse assumir, mesmo que talvez já não o amasse, mesmo que tivesse dúvidas ou não quisesse pensar sobre isso. Desde que chegou à cidade, ele fora seu único namorado, com quem conheceu e viveu tudo até ali. Talvez esse momento imediatamente posterior à separação reavivasse uma solidão que nunca saiu de dentro dela, porque quem não é sozinho não vincula suas vivências a uma só experiência. Talvez fosse somente uma fase até ela passar a se relacionar com a própria vida sem a mediação de Léo.
Numa noite em que se encontraram e se comportaram civilizadamente, em meio a uma inocente carona, Laís contou a Léo que vinha saindo com alguém. Era um sujeito mais moço, parece. Disse, risonha, que o rapaz queria coisa séria, mas ela preferia ir com calma, afinal, acabara de se divorciar e queria aproveitar o novo momento. Léo não sabia se aquilo era uma indireta, mas gostou de saber que ela decidira viver a vida que lhe cabe. A Verônica, a história soou falsa.
- Carona, Léo? Agora, além de discutir a ex-relação periodicamente, ainda tem carona?
- Ela está começando a aceitar com mais tranquilidade... Sermos amigos vai ser bom, vai tornar tudo mais fácil.
Um lapso de insegurança como esse não combinava com a personagem que Verônica se habituou a interpretar na vida de Léo. Mas diante do que ela observava, a previsão de tempos tempestuosos não permitiu que ela se fizesse de bem resolvida.
Ela estava certa. A paz e a amizade não duraram muito, pois logo Laís descobriu que a moça com quem Léo saía era ninguém menos que sua paixão de faculdade, de quem ele tanto lhe falara. Pois então, como aquele romance não havia de ter importância? E se tinha importância, como não calcular que os dois já tivessem se encontrado desde antes da separação? E se já vinham se encontrando, como dominar o orgulho ferido e a certeza de que o rapaz estava mais feliz nesses poucos meses do que nos sete anos anteriores?
Deixou-se atormentar pela própria imaginação até não suportar. Desapareceu dos happy hours por um tempo, mas voltou porque aquele lugar era seu também, e ali, Verônica não entrava. Certo dia, bebeu drinks a mais e foi novamente cobrar o ex-marido.
- Faz poucos meses que estamos separados, o divórcio nem saiu, e todo mundo sabe que você sai com essa mulher.
- Por que isso te incomoda? Você está bem, eu também... Somos amigos!
- Amigos uma pinoia! Você não me respeitou, Léo! Você me expõe, me faz sentir descartável!
A noite foi longa. Laís chorou um pouco, alegando profundo desconforto com o namoro do ex-marido. Léo fez e falou de tudo para mostrar que nada aconteceu antes de se separar dela. Ela, aos poucos, envergonhava-se da cena, sentia-se frágil sob olhares de canto de olho dos amigos no bar. A conversa terminou com um novo abraço amistoso.
- Desculpe-me... No fim, acho que me sinto mal porque ela tem tudo que você sempre quis que eu fosse, mas eu não sou.
A frase entrou no corpo de Léo pelos ouvidos feito um punhal que corta tudo por dentro até se aninhar no coração, não sem antes destroçá-lo.
Talvez o passar dos meses e dos anos tenha tornado comum uma mulher que já fora tão especial. Agora, o encanto dele pela vivacidade de Verônica fazia com que ela fosse apenas a pobre mortal que ele já viu despertar pela manhã centenas de vezes.
Léo começou a ficar confuso. Não sentia paixão por Laís, não sentia desejo, mas sentia-se responsável. Sentia culpa, gratidão, carinho, tristeza e frustração. Ainda estava preso a esses sentires. Em alguns momentos, pegava-se pensando em como eram os dois quando se conheceram. Ele, cético, cabisbaixo, coração em cicatrização por causa da paixão nunca correspondida pela velha amiga da faculdade. Laís parecia uma gata arisca, sua pouca experiência nas festas e aventuras que quase todos vivem na juventude fazia com que ela se comportasse em movimentos circulares de autoproteção. Encontraram-se no momento certo para se amarem e serem felizes juntos. Mas o momento tinha acabado.
Devagar, ele retomava a mania de ser cabisbaixo. Verônica notava esse movimento. O homem que a amava após poucas semanas de convivência agora queria tempo para ficar sozinho, e carregava um fardo no olhar que comprometia o brilho que estava ali antes.
***
Continua...
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