sexta-feira, 10 de outubro de 2014

O relacionamento - 2 de 7

Acesse a parte 1 aqui.

Bebeu sozinha durante horas. Romeu mal conseguia lhe dar atenção porque, no bar, ele fazia as vezes de garçom, caixa, barman e até cozinheiro. O amigo se concentrava em alterar o rumo da prosa para que ela não pensasse somente no tal do Gentil. Tentava outros assuntos, perguntou dos quadros que ela pintava, falou que andava com paredes vazias, quis saber da escola onde lecionava, de novela, de qualquer coisa. Mas Teresa não estava para conversa mole, trazia uma expressão de dor, de rancor, de rejeição. Essa porcaria desse sentimento de rejeição.

Antes que Romeu fechasse o bar, ela decidiu sair andando. O álcool no sangue a encorajava a caminhar sozinha pelas ruas de Santo Antônio de Lisboa como se elas levassem ao Méier. Conversou com os paralelepípedos, choramingou para os poucos passarinhos acordados àquela hora. Chegou ao mar e desabou em prantos.

Nem sabia direito de onde vinha tanta dor. Não é racional. É só um homem, ok, eu sei. Saber disso não ajuda a parar de chorar. Saber que há muitos homens no mundo também não ajuda. Imaginar que ele não a merece não só não ajuda como dá vontade de se atirar ao mar com um paralelepípedo preso à perna. Dane-se merecimento. Não sou prêmio de maratona.

Gente que dá esse conselho só pode fazê-lo por não saber o que dizer. Não há outra explicação. O que eu deveria fazer então? Pedir que o candidato preencha um formulário e disserte sobre seus defeitos e suas qualidades, anexando um exame psicotécnico? Ou melhor, abro um processo de seleção dividido em três fases, para que todos os interessados ao posto se enfrentem e eu possa chegar ao homem de méritos suficientes. Ora, que bobagem. Quero ser livre para desejar o mais vil.

E aqueles que dizem, conformados, que “não tinha que ser”?! Esses são os mais odiosos. Porra, então, o que é que tinha que ser? Aquele que me quis e eu rejeitei, para quem disseram que eu não o mereço e que nossa relação “não tinha que ser”?

Vamos recuperar a história recente e imaginar o que é que tem que ser. Teresa pôs-se a rememorar seus últimos fracassos. O último ex-grande amor de sua vida compareceu à sua festa de aniversário, o que a encheu de alegria, para, em seguida, enchê-la de sublimes e sinceros votos de infelicidade eterna ao atracar-se contra uma mocreia voluptuosa que vestia preto. O anterior a esse foi superado quando deixou de responder e-mails ou mensagens de celular – por que diabos homem faz isso?! Ser derrotada pelo silêncio é acachapante. E antes, tinha tido aquele que simplesmente voltou para a ex, na maior cara de pau. Aquela sonsa.

Quando nasci, um anjo bebum, desses que tropeçam nas pernas, filosofou no boteco: vai, Teresa, ser gauche no amor.

Teresa, mesmo sentada na areia, cambaleava. Ao seu redor, todo o comércio estava fechado. A alguns metros, avistou alguns bêbados batucando e cantando felizes da vida. Que tipo de idiota teria tantos motivos assim para ser feliz àquela hora? Nem cerveja mais havia!

Havia sim.


***
Continua...

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