Música, feminismo, diálogos, política, futebol, crônica e poesia convivendo no mesmo espaço. E sem conflito.
quarta-feira, 16 de dezembro de 2015
Deja vu - Um conto de revéillon (parte 1)
Cabrum! Puf, puf, tum!
A mulher caiu de cima do telhado, logo após a virada do ano. Nem todos os convidados perceberam, havia o som dos fogos de artifício, que causavam ruídos bem mais potentes, e também havia gritos comemorativos, garrafas de espumante sendo estouradas, votos de felicidades feitos aos berros. Abraços eram distribuídos indiscriminadamente, e ela estava ali no chão, atordoada, os olhos um pouco zonzos, sem sentir as feridas que a queda provavelmente lhe causara. Como que anestesiada, como que procurando entender o que tinha acontecido.
Quem primeiro se aproximou foi um estranho, vestido de azul. Pareceu preocupado com o que viu:
- Você está bem? Quer ajuda, precisa ir pra um hospital?
- Quem é você?
- Eu tô aqui na festa também. Você quer ajuda?
- Tem muita gente nesta festa que eu não conheço. Ano que vem vou convidar só os meus amigos.
Tentou levantar-se sozinha, estava um pouco embaraçada pela situação. O rapaz não se intimidou pela grosseria e tentou ajudá-la. Ela aceitou o braço, apoiou-se para subir, e então, percebeu que mais pessoas começaram a se aproximar, algumas corriam até ela. Eram amigos.
- O que aconteceu?
- Ela caiu.
- Você está bem?
- O que houve?
- Onde você estava?
- Caiu de onde?
- O que você estava fazendo no telhado?
- Feliz ano novo, Carol!
Aquele ajuntamento de gente a fez sentir ainda mais atordoada. Olhava ao redor, via pessoas de caras misturadas, não conseguia um foco: todo mundo estava um pouco confundido nos seus olhos. Dava pra ver que havia conhecidos naquela pequena multidão, mas havia também uma porção de curiosos que ela nunca tinha visto.
- Eu estou bem gente, tá, chega.
Foi obrigada a abraçar todo mundo de feliz ano novo. Não sabia que cargas d’água fazia no telhado. Não lembrava como foi parar lá, não lembrava a queda, só percebeu quando já tinha se chocado violentamente contra o chão. Agora, temia ter quebrado alguma coisa. Uma costela, um deslocamento de qualquer coisa. As dores começavam a se mostrar.
- Feliz ano novo, linda.
Reconheceu o rosto sorridente do amigo. Como se tivesse encontrado uma referência de quem era ela mesma, abraçou-o forte.
- Por favor, me perdoe! – ele pediu, docemente.
- Foi você que me jogou do telhado?
- Ahn? Não!
- Por que está me pedindo perdão?
- Porque você tem toda razão, eu fui ridículo. Foi uma tentativa de autoboicote, sei lá...
- O que você fez, criatura?
Érico afastou-se um passo para trás e olhou Carolina desconfiado. Não encontrou nada em sua expressão que lhe desse pistas de para onde aquela conversa iria.
- Carolina, você está brincando comigo?
Ela não sabia de que ele estava falando. Teria feito alguma coisa má que ela nem notara? Ou será que a queda a fez bater com a cabeça e então perdera a memória?
Ele também não entendia nada.
- Você está querendo dizer que está tudo passado e esquecido?
- Eu estou dizendo que não estou braba com você!
- Então me perdoou?
- De quê, criatura?
Nada fazia sentido.
***
Continua...
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