Mais um caso - mais um! - de violência contra a mulher termina de forma trágica. Aqui no Rio Grande do Sul, na cidade de Sapucaia do Sul, região metropolitana de Porto Alegre, um homem de 41 anos fez a ex-mulher, de 51, refém por quase 24 horas.
A polícia cercou a casa e iniciou as negociações com o agressor. Ele já havia anunciado, segundo relatos da família dela, que, caso não reatasse o relacionamento com a mulher, ele a mataria. Na segunda-feira, tentou invadir a casa. Na terça-feira pela manhã, conseguiu.
Ainda segundo relatos, durante o relacionamento, a mulher era agredida pelo então companheiro. Consta que há B.O. registrado por ela, e que havia uma medida protetiva a seu favor. Mas nesta manhã, ela sofreu tentativa de asfixia, e encontra-se, agora, hospitalizada em estado gravíssimo.
A imprensa brada, com sua "indignação" costumeira: a polícia não está preparada!!!
Eu pergunto: a imprensa está?
Até quando trataremos casos de violência contra a mulher como "crimes passionais"? Parece uma simples troca de expressão, mas não é. É preciso visibilizar que se trata de um crime decorrente da profunda desigualdade entre homens e mulheres, não uma ação motivada por paixão ou desespero. Esta segunda opção de tratamento acaba trazendo em si algum atenuante para um crime que deveria ser percebido como intolerável. Quantas terão que morrer? Quantas viverão suas vidas sob violência, ameaças, medo?
Ouvi a coletiva concedida pelo coronel responsável pela operação. As perguntas dos colegas jornalistas raramente chegavam ao X da questão. Queriam saber por que a polícia não invadiu a casa antes, por que não atirou, por que não havia escutas dentro da casa. Durante o tempo que acompanhei, nenhuma questão sobre o óbvio: se havia uma medida protetiva, se havia registros da violência sofrida anteriormente, se havia ameaças de morte, por que deixamos a situação culminar com a invasão da casa dela?!
Uma colega, comentando o caso no rádio, dizia do quão diferente são os casos "passionais" dos crimes "comuns", já que, nos primeiros, o agressor não se importa com sua própria vida. Quase bati o carro ao ouvir uma atrocidade dessas. Uma análise estúpida, que desconsidera o histórico de cada situação, desconsidera o genérico das situações e despreza, completamente, a realidade de desigualdade vivenciada pelas mulheres. É como se os homens fossem "naturalmente" violentos e descontrolados. A velha história da "legítima defesa da honra", só que com outra roupa.
Os casos de violência contra mulheres são cotidianos. A ausência de políticas efetivas de prevenção é preocupante. A abordagem da imprensa é rasa.
De acordo com levantamento do jornal Zero Hora, seis mulheres foram mortas no Rio Grande do Sul nos últimos oito dias. Os dados da Secretaria de Segurança Pública apontam que 42 mulheres foram mortas entre janeiro e maio no estado, mais da metade, pelo parceiro ou ex-parceiro.
Até quando? Enquanto tratarem esse tipo de crime como "passional", ficará subentendida uma extraordinariedade que não há. Muitas são as mulheres vitimadas. Todos os dias há mulheres sofrendo algum tipo de violência. Vamos esperar que elas morram nas mãos de parceiros ou ex-parceiros, então exigiremos a prisão deles?
Ainda falta muito preparo à polícia, às autoridades da segurança pública, à imprensa para que os casos de violência contra a mulher sejam enfrentados onde se deve: na raiz.
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