A estrada é minha noiva.
Não posso esperar mais que isso,
Não posso contrariar quem eu sou.
Deixo-me guiar por estrelas sopradas
Por ventos que cantam a estrada,
Em laços recém-desatados,
Em caminhos recém-descobertos.
Porque se eu paro, não fico
Ou fico ali em aberto.
Tentei cantar, escrever, discursar.
E se nada disso fiz bem,
As palavras carrego comigo
E elas me levam também.
Tentei ouvir e falar
Fingi ser alguém e ninguém
Assisti ao desabrochar
De gentes, canções e poréns.
Mas nunca lhes pude colher
Pois na ânsia de achar meu lugar
É que pude perceber:
Só a estrada é que me tem.
Despertei paixões,
Algumas me despertaram.
Algumas me mataram.
Mas sempre revivi no amor da estrada.
Consolando-me em raiares e pôres de sol,
Que acontecem todos os dias,
Porque há motivos.
A estrada me arranca do chão,
Transportável como as sementes,
Etérea como um desejo.
E quando eu me for, saberão
Que deixei a mim mesma por aí
Em tantos lugares que vi
Que será impossível juntar-me
Para ser inteira,
Mas é também verdadeiro
Que me juntando, eu não seria
Eu.
***
Poema eternamente inacabado...
Música, feminismo, diálogos, política, futebol, crônica e poesia convivendo no mesmo espaço. E sem conflito.
quinta-feira, 30 de maio de 2013
terça-feira, 21 de maio de 2013
Princípio de adeus
Desmancham-se fachadas de prédios
Derretem-se, suaves, avenidas e ladeiras
Escorrem pelo chão as tantas árvores
Os parques.
Aos poucos, a vista ficou embaçada
Há manchas esfumaçadas
Onde antes havia céu, lago, sol
Nublou-se a história de lá
Ofuscando a memória de si
No espaço de um tempo sem dó.
Pelo ar, desfazem-se endereços
Adereços
As referências se desmaterializam
As consciências se descombinam
As aparências se descortinam.
Como numa pintura impressionista,
A fartura de luz
Retira das coisas
Fronteiras e limites.
Caem pedaços de paisagem
Faltam metades em tudo
Nada que havia ainda há
Mas nada desaba:
Apenas o sutil movimento do fim.
Já houve tanto, já houve tudo
Já houve sentido
Por fim, houve o amor,
Que, em se passando,
O futuro esgotou.
Uma página em branco espera uma nova pintura
Uma partitura
E compor desde agora
A imagem cubista
Do que ainda será.
domingo, 19 de maio de 2013
A sina inexata
A minha sina
É saudade sentida
Em gotas de sangue.
É a ausência infinita
Que perturba e agita
E me põe a buscar
O que nunca está lá
(e nem vai estar).
O vazio no peito,
Que sobra inconstante
Da eterna depedida
De rever, num instante
O que, talvez, não se viu
Na ansiedade de vida.
Um trem de cores que me leva
Para a imensidão
Do céu sobre mim
Ao som de uma flauta,
A tristeza inexata
Que nunca me mata
Mas faz-me assim.
Somente saudade.
A minha sina
É saudade sentida
Que rasga as cortinas
Do meu próprio lugar.
E inventa esquinas
Para forjar as vias
De eu me encontrar.
A minha sina
É saudade sentida
Que vem e me invade
E assim me amacia.
A minha sina
É morrer de saudade,
No mínimo,
Uma vez por dia.
segunda-feira, 6 de maio de 2013
A poesia...
Não tente ler, nas poesias, o(a) poeta como um ente individual. Ainda que, para usar palavras do mestre Belchior, o seu delírio sejam as experiências com coisas reais, a inspiração tem diversas fontes, canais, espelhos. A poesia extrapola os limites de um sentir simples, de uma história contada. É sempre a partir do olhar de alguém - o do(a) poeta -, mas os motivos de sua inspiração, de sua imaginação, de sua criação... Podem ser mais complexos do que parecem.
Por isso, não trate a poesia como se fosse o "meu querido diário" do(a) poeta!!!
quarta-feira, 1 de maio de 2013
Cheia
Vestiu olhos de lua cheia,
Seu corpo de maré cheia.
E, como uma árvore cheia
de flores e frutos,
Saiu.
Estava cheia
De esperar.
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