Eu tinha andado por Cartagena antes, de mãos dadas com Gabriel García Márquez, acompanhando com os olhos e o palpitar do coração a história de Florentino e Fermina, mas então eram outros tempos. A cidade hoje está muito mudada.
O mar continua lá, mas as águas são outras. Jogar-se nelas permite uma navegação tão sem fim, que dá medo de não voltar. Não medo. Mais aquele frio na barriga. O receio sedutor do que é desconhecido e irremediável. O azul está aturdido pelo cinza dos dias nublados de inverno, mas acaba que me faz lembrar o verde escuro de Copacabana, ou, com esforço, até o verde-marrom dos mares da minha infância. Mas o infinito do mar é sempre o mesmo, e é assim pra mim como foi pra Florentino também. E há de ser para muito mais gente que vai vir navegar em outras águas do mesmo mar.
Embriagada de poesia e amor pelo ar que um dia Gabo respirou, é como se não fosse permitido sair sem escrever. Escrever é sentir tanto que precisa transbordar pelas pontas dos dedos num teclado, para não explodir. E o que eu sinto é tão igual, mas as águas são outras. Passou muito tempo. Mas nem tudo muda tanto assim. "A sabedoria nos chega quando já não serve para nada". Mas ela fica aí, servindo para quem vem depois e a apanha no ar.
"Coisa bem diferente teria sido a vida para ambos se tivessem sabido a tempo que era mais fácil contornar as grandes catástrofes matrimoniais do que as misérias minúsculas de cada dia. Mas se alguma coisa haviam aprendido juntos era que a sabedoria nos chega quando já não serve para nada".
(Gabriel García Márquez - O amor nos tempos do cólera)
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