"O correr da vida embrulha tudo. A vida é assim, esquenta e esfria, aperta e depois afrouxa, aquieta e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem". (Guimarães Rosa)
O jornalista e escritor gaúcho Fabrício Carpinejar tem uma ótima crônica sobre a ansiedade. Dizia ele: “Sou ansioso, minha sensibilidade parece que está de plantão. (...) Sou ansioso porque espero a vida com urgência”*.
Imagine, então, o que é ser ansioso diante de uma famigerada “fase de transição”, aquela famosa e infinita ligação entre um ponto e outro. O “um ponto” você está deixando. O “outro” é aonde você quer chegar. Ou melhor, aonde você vai chegar, isso é certo. Por isso, inclusive, é que a ansiedade fica desperta e saltitante: já que você vai chegar, que seja logo.
Vejamos, é como se fosse o trânsito de uma grande cidade. Melhor: o trânsito de uma cidade grande que você ainda não conhece bem. Você sai de casa e vai pro trabalho. Vamos supor que é um trajeto longo, ou então, que é “horário de rush”. Você sabe bem aonde vai, a ansiedade não é produto de um destino desconhecido. Mas a demora para chegar é incômoda, porque, inclusive, é inestimável. E incontrolável. Dependendo do fluxo de automóveis ou da vontade dos deuses, você pode demorar 40 minutos ou 2 horas.
Começa a demorar mais do que o previsto. Pode ter sido um semáforo enguiçado, um acidente de trânsito, obras na pista, qualquer coisa. Pode até ser que você tenha pegado o caminho errado, na ânsia de se antecipar. Daí vem a angústia, o mau humor, o estresse, o medo do erro... até uma insegurança de não chegar.
Quem conhece o caminho não tem medo de errar, nem de perder a hora. Mas no nosso caso hipotético aqui, o caminho não é familiar. Você sempre pode se perder. Ou estimar mal o tempo que leva. Ou desconhecer as melhores rotas. Ou se surpreender com frequentes contratempos que não abatem os que já passaram por ali. Enfim: quem não conhece o caminho que leva ao ponto aonde se quer chegar sofre mais de ansiedade e de todos os males que dela decorrem.
Acontece que aqueles que não têm esse problema já tiveram, pelo menos, uma vez. Todo caminho é desconhecido pra quem nunca passou por lá, ué. Mas depois de passar, por mais longo, esburacado ou escuro que seja, você já conhece. Pode desviar dos buracos, levar uma lanterna. Pode sair de casa com o tempo calculado.
Veja que não estamos falando, aqui, de um destino desconhecido – e isso é importante. Porque quem não sabe aonde vai chegar, ou não quer saber, ou ainda está descobrindo, tem outro tipo de problema de que não falaremos aqui...
É assim na vida. O que você nunca enfrentou antes te amedronta. A ansiedade parece que devora o corpo e a alma. Quer que o tempo passe logo, quer dormir e acordar quando tudo estiver pronto. Quer que o caminho seja mais rápido do que você mesmo. Pra não sentir o caminho...
Não tem outro remédio, se não, paciência. Confiança. Claro que precaução também nunca é demais. E confiança não pode ser em excesso... não tem jeito, o caminho está lá e você tem que cumpri-lo. Não há teletransporte. Você pode tornar o caminho mais ou menos árduo na medida em que controla ou não sua ansiedade, seu mau humor, sua insegurança. Fácil não é. Mas é melhor facilitar.
Levar uma boa música pra ouvir, um bom livro para ler. Levar coisas boas na lembrança do “um ponto”, levar expectativas boas do que vai encontrar no “outro”. Assim, a ansiedade de quem espera a vida com urgência fica mais suportável...
* “Ansiedade” é uma crônica de Carpinejar que pode ser lida em Canalha!, dele, publicado pela Editora Bertrand Brasil.
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