sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Epifania

Andava por aí distraída, sem se importar demais com nada. Os dias não se dividiam um do outro. Foi um oi singelo que lhe tirou do cárcere de si mesma. E desde então o mundo se floriu.

Que bobagem, se era só um simples oi... Mas o oi foi o que lhe fez olhar que havia mundo ao seu redor. Que nem se fosse um estalar de dedos que desperta alguém de uma mágica que faz ficar paralisado.

O oi estalou pra ela. Mas o oi não é sujeito, sujeito é quem disse oi. "Oi!", meigo assim.

O oi lhe tirou da inércia, e ela ficou flor. Andava por aí iluminada agora. Às vezes, ruborizada. Tudo parecia mais alegre.

- Que criatura boba, iluminada por um oi.

Num dia pesado, saiu de casa pra ver o oi virar sorriso. Só pra isso saiu. Sabia onde colher. Andou determinada agora e foi até lá. Viu o sorriso. Iluminou-se mais. Voltou pra casa feliz.

- Que criatura boba, sorriso se vê em todo lugar.

Que nada. Tem um monte de sorriso que não sorri. Um sorriso que se vê nos olhos não é todo dia não. E o sorriso não é sujeito, sujeito é quem sorri. Isso faz toda a diferença.

Desejava verdadeiramente poder para sempre extrair sensações boas de paz daquele sorriso.

- Mas ois e sorrisos não se realizam em si mesmos!

- Ora, e por que precisa dar utilidades pragmáticas pra tudo?

Recolheu os ois e sorrisos e sensações boas de paz e foi dormir. Acordou de bom humor.

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Rio Grande do Sul...

Alguns anos atrás, eu tinha escrito um poema que era mais ou menos assim:


Eu queria ser gaúcha
Porque de tanta coisa linda que vi no sul
As pessoas são a melhor delas
Porque sua capital é vermelha
Porque seu pôr-do-sol despretensioso e belo
Parece que se converte em notas musicais.

Mas não posso ficar longe do Rio

Ir até lá respirar de vez em quando
Só pra sentir a paz de estar abraçada pela Guanabara

Também não dá pra abrir mão do Recife

Vê-lo transbordar cultura, sabedoria
História e consciência de si
Respeitar seu próprio sotaque,
E permitir que você tire forças da Praia de Boa Viagem.

E nunca vou esquecer que foi a jovem capital federal

Que mudou a minha vida
Ao me ver em mim
E me mostrar pra mim mesma.

Recentemente passei a amar minha São Paulo.

Foi ela que me ensinou a ver esse mundareu de coisa boa.


Não lembro bem, eu meio que perdi o original. Ao tentar recompô-lo, creio que escrevi outro. Mas a ideia era essa.

Pensei nesse poema por causa do início dele, e porque hoje moro em Porto Alegre. Dia 20 de setembro é feriado no Rio Grande do Sul, data que recupera a Revolução Farroupilha. Eu não tenho lá muito apreço pelo bairrismo mítico, prefiro vê-lo na sua expressão simpática de "rir de si mesmo".

E adoro essa coisa polarizada do Rio Grande do Sul. Ou morre de calor ou passa muito frio. Ou é Inter ou é Grêmio. Esquerda ou direita. Gosto da forma como o povo de Porto Alegre habituou-se a ocupar o espaço público, entendendo como seu, mas não só seu. Sinto isso ao passear pela Redenção num domingo, pelo Gasômetro, pela zona sul. Gosto da forma como fui acolhida pelos que já me esperavam chegar, mas especialmente, pelos que nem sabiam que eu chegaria e me puseram pra dentro de suas vidas.

Ainda falta muito pra ver. Mas os pampas de Bagé, as ladeiras (lombas!) da Serra Gaúcha, o mar marrom do litoral, o charme tão peculiar das cidades na beira da Lagoa e a diversidade da vida na região metropolitana compõem um cenário tão plural que não pode ser simplificado nisso que se propagandeia como "a" tradição gaúcha. A que desfila no 20 de setembro é só uma das facetas. O Rio Grande do Sul é muito mais.

Eu não ligo quando chove, eu me aborreço muito quando faz 2ºC, eu torço pra chegar o verão, eu imagino muitas coisas que poderiam acontecer, e busco me inserir nas que acontecem. Vou à feirinha de orgânicos, adoro comer xis, acho o Beira-Rio o estádio mais bem-posicionado que eu conheço e acho que dividir um chimarrão na sala de aula é um gesto sutil de dizer ao outro que você é amigo dele. Atitudes simples que fazem brilhar um cotidiano. É isso, é tudo isso: o Rio Grande não te deixa ser indiferente. Ele é um convite a se posicionar.

Obrigada por me receberem.