quarta-feira, 25 de novembro de 2009

O assassino era o escriba

(Paulo Leminski)

Meu professor de análise sintática era o tipo do sujeito inexistente.
Um pleonasmo, o principal predicado de sua vida,
regular como um paradigma da 1ª conjunção.
Entre uma oração subordinada e um adjunto adverbial,
ele não tinha dúvidas: sempre achava um jeito
assindético de nos torturar com um aposto.
Casou com uma regência.
Foi infeliz.
Era possessivo como um pronome.
E ela era bitransitiva.
Tentou ir para os EUA.
Não deu.
Acharam um artigo indefinido na sua bagagem.
A interjeição do bigode declinava partículas expletivas,
conectivos e agentes da passiva o tempo todo.
Um dia, matei-o com um objeto direto na cabeça.

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Viva a língua portuguesa! Contra a reforma ortográfica neoliberal do Governo Lula! rsrs... adoro este poema, queria socializar.

Uma história encomendada

Era quase uma matrix. Ele fingia que era ele, ela fazia de conta que era ela. Desempenhavam papeis. Era tudo fajuto, das juras de amor à convivência harmônica. As joias de presente eram falsas. O pijama não era 100% algodão. As flores eram de plástico.

Em alguns momentos, cansavam-se de interpretar. Nada que uma noite de sono não curasse. Era fácil levar a vida assim, porque ela nunca desviava do destino encomendado. Nunca se perdiam as estribeiras. Não havia decepção, risco, mas também não havia euforia.

Um dia, ela se esqueceu de mentir. Deixou a cara de verdade aparecer. Foi um susto.

Não souberam como lidar com essa situação. Chegaram a sentir desespero. Ela tentou corrigir rápido, mas não dava mais tempo. Por não saber reagir, ele também acabou se revelando.

Se separaram e foram infelizes para sempre.

***
Moral da história: a moral foi inventada por alguém.

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Um ano

Hoje este blog completa 1 ano...

Até que é bastante coisa. A internet tem essa democracia de abrir espaço pra quem quer falar, mas ainda não oferece a democracia do acesso ao que se fala...

Pensei em festejar o ato de escrever, de opinar, a língua portuguesa, as palavras, os conteúdos, os instrumentos... mas decidi falar sobre "ser livre".

No blog, posso escrever minhas crônicas, meus artigos de opinião, reproduzir textos de informação, sem que ninguém me considere uma criminosa por escrever sem ter diploma de jornalista. Aqui eu não sou perseguida pelos guardiães do corporativismo, que priorizam a batalha por reserva de mercado que a luta por regulamentação da imprensa, do exercício da profissão, na perspectiva da democratização da comunicação. Ninguém, aqui, pode pedir pro provedor me excluir pelo fato de estar escrevendo sem ser formada em jornalismo.

Enquanto isso, jornalistas diplomados escrevem suas matérias reproduzindo os velhos preconceitos e a mesma hierarquização que se vê há décadas e décadas. O sensacionalismo tosco diante de tragédias particulares e coletivas, a abordagem viciada de temas polêmicos, a prioridade editorializada da opinião de uns poucos sobre tudo e mais um pouco. Mas os leads estão perfeitos! (mentira, muitas e muitas vezes não estão) As entrevistas estão impecáveis e as fotos estão bem escolhidas! (como se isso fosse produto, meramente, de uma técnica pretensamente "neutra")

Ora, vão destruir o excelente jornalismo que temos no Brasil ao acabar com a obrigatoriedade do diploma de jornalista!!! A solução é... colocar na Constituição!

Quanta bobagem.

Quero, antes, ver uma nova Lei de Imprensa ser elaborada democraticamente e aprovada pelo Congresso Nacional, dentro de paradigmas muito distintos dos que embasaram a Lei anterior. Quero ver regulamentado o direito de resposta, quero que a imprensa seja imprensa e não Poder Judiciário, quero que não haja impunidade, quero que não haja censura. Quero que se regulamente o exercício do jornalismo, e não que se resuma isso a uma formação particular. E quero, principalmente, que tudo isso se dê a partir do princípio da democratização da comunicação, do incentivo a veículos comunitários e populares, do fim da propriedade cruzada, do controle social. Repito, em letras garrafais: CONTROLE SOCIAL. De novo, pra não ter dúvida: CONTROLE SOCIAL.

A liberdade de imprensa não é uma liberdade de empresa. E nem liberdade SÓ da imprensa. Muito menos SÓ de ALGUMA imprensa.

Pra usar a sabedoria popular, a liberdade de um termina onde começa a do outro... Desde os meus tempos de Enecos (Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação Social - contra a obrigatoriedade do diploma), sabíamos que só podemos ser livres juntos.

Pela democratização da liberdade!

“Liberdade, essa palavra que o sonho humano alimenta, que não há ninguém que explique e ninguém que não entenda.”
(Cecília Meirelles)

domingo, 8 de novembro de 2009

Manifestação Contra a Violência Sexista

São Paulo - Vá à Uniban protestar!

Os Movimentos Feminista, Sindical e Estudantil convocam um ato contra a violência sexista ocorrida na UNIBAN, que neste momento tem como agravante a expulsão da aluna que recentemente sofreu violência, ou seja, a vítima foi transformada em ré, os agressores estão impunes. A UNIBAN, com essa conduta, banaliza, estimula e justifica a violência contra a Mulher.

NÃO podemos nós calar!

ATO nesta segunda-feira, 9 de novembro, às 18 horas na porta da UNIBAN São Bernardo do Campo.

Endereço: São Bernardo do Campo – Avenida Rudge Ramos, 1501 (fica no KM 12 da Via Anchieta) para quem sai de são Paulo é necessário fazer o retorno.

Saudações feministas
Marcha Mundial das Mulheres

Mensagem da UNE:

UNE protesta contra discriminação por uso de vestido curto

Nós, mulheres estudantes brasileiras, vimos a público repudiar todas as forma de opressão e violência contra as mulheres. No dia 22 de outubro deste ano, uma aluna da Uniban (campus ABC – São Paulo), com a falsa justificativa de ter ido à aula de "vestido curto", é seguida, encurralada, xingada e agredida por seus "colegas estudantes".

A cena de horror é filmada, encaminhada à Internet e vira notícia por todo o país. Não aceitaremos que casos de machismo como esse passem despercebidos ou que se tornem notícia despolitizada nos meios de comunicação.

O fato em questão revela a opressão que as mulheres sofrem cotidianamente, ao serem consideradas mercadoria e tratadas como se estivessem sempre disponíveis para cantadas e para o sexo. Não toleramos comentários que digam que a estudante "deu motivo" para ser agredida. Nenhuma mulher deve ser vítima de violência, nem por conta da roupa que usa nem por qualquer outra condição. Nada justifica a violência contra a mulher.

Sendo assim, nós, mulheres estudantes brasileiras, organizadas na luta pelo fim do machismo, racismo e homofobia, denunciamos a violência sexista ocorrida contra a aluna da Uniban, nos solidarizamos com as mulheres vitimizadas por esses crimes e queremos punição a todos os agressores envolvidos nesse episódio e em outros tantos que acontecem e não repercutem na mídia. Não vamos nos calar perante o machismo e a violência.

Somos Mulheres e não Mercadoria!

Diretoria de Mulheres da União Nacional dos Estudantes


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Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres do Governo Federal cobra explicações da Uniban.

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Sensação de casa de férias

Quando me mudei para o Largo do Arouche, para morar na companhia do amigo Anderson Campos, comentávamos entre nós que aquela nossa casa nova parecia uma casa de férias. Eu lembro da sensação. Eu nunca tinha morado sozinha, e parecia uma coisa tão cheia de liberdade, e uma felicidade sortuda de dividir um apartamento no centro com um amigo querido, com que isso trazia essa coisa gostosa de sensação de casa de férias. Como todas férias, dá medo de que acabe logo...

Mistura-se com isso o fato de que nos mudamos num dezembro. Fim de ano também dá sensação boa. Pelo menos, pra mim. Não é de nostalgia, de melancolia. É de vontade de viver mais, em paz com o mundo e comigo... é aquela trivialidade de retomada da esperança, de mudar o que não gostamos, de fazer promessa de sermos melhores por termos vontade disso, de fato. Um tempinho pra descansar, pra ter expectativas. Sensação de dever cumprido e disposição de encarar os desafios novos. Depois de uma certa idade, você torce para que os desafios sejam novos. Mas isso é outra história.

Enfim. O Anderson, quando saí de casa, me disse que aprendeu em Jericoacoara (nossa viagem de ano novo, entre amigos) que sempre haverá casas de férias. Isso não acaba.

Domingo último acordei com essa sensação. Esquisito. Lembro que, ano passado, só me dei conta do fim do ano quando ele já estava quase no fim mesmo. Este ano é diferente. Este ano foi tão intenso que eu estou sentindo ele acabar desde agora. Talvez não com todas aquelas sensações que descrevi acima, pelo menos, ainda não na sua plenitude. Mas com a alegria que elas trazem.

Acordei domingo como se fosse dia de Natal. Aquela coisa gostosa de só encontrar quem você quer encontrar. De não ter horário de acordar e de dormir. Uma sensação de mandar no próprio tempo. Era um contexto de felicidade que trouxe mais bons sentimentos. Não sei. Uma epifania.

Eu queria ser capaz de prolongar essa sensação de felicidade ao máximo. Sempre ter uma casa de férias. Mas isso todo mundo quer, não? Controlar medo, ansiedade, controlar tudo que é ruim e amplificar o que é bom. Naquela manhã de domingo, foi a percepção de que isso é mesmo possível que tornou o dia tão feliz quanto um 31 de dezembro de ano de missão cumprida.